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Eis que esta semana estreia Pequeno Segredo (2016), protagonista de uma das grandes polêmicas do ano, motivada não apenas por questões puramente cinematográficas, mas também pela seara sócio-política. Escolhido para ser o representante do Brasil no Oscar 2017, quando boa parte das pessoas apostava na indicação de Aquarius (2016), de Kleber Mendonça Filho, o longa-metragem de David Schurmann finalmente se submeterá ao crivo do público. Já a crítica tem sido, em sua maioria, um tanto impiedosa com seus atributos “a cara do Oscar” – para usar um dos argumentos da comissão do Ministério da Cultura responsável pela controversa nominação. Há quem ache essa quase obsessão pelo Oscar uma grande bobagem. Contudo, há quem valorize o peso de uma eventual vitória brasileira. Pensando nisso, o Papo de Cinema foi vasculhar o passado e escolheu 10 fortes candidatos que já representaram nosso país na disputa promovida pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. Confira!

 

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O Pagador de Promessas (1962)
Anselmo Duarte conseguiu um feito histórico com este seu segundo trabalho na direção, ao conquistar a Palma de Ouro em Cannes – até hoje a única atribuída a um filme brasileiro. Apesar de ter dividido a crítica nacional da época, pois muitos viam seu estilo mais clássico como destoante do que ocorria no cenário cinematográfico do país com o surgimento do Cinema Novo, o longa-metragem que adapta a peça de Dias Gomes cativou François Truffaut e os outros membros do júri ao apresentar os conflitos entre a religiosidade popular e a religião oficial, numa metáfora contundente das contradições sociais do Brasil. A história mostra Zé do Burro (Leonardo Villar, em atuação magistral), sujeito humilde que, ao lado da esposa, Rosa (Glória Menezes, também excelente), realiza uma peregrinação até Salvador carregando uma pesada cruz de madeira, para pagar uma promessa pela recuperação de seu burro. Ele encontra a resistência do padre Olavo (Dionísio Azevedo) que proíbe sua entrada na igreja. O prestígio internacional rendeu a primeira indicação brasileira ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, porém, se em Cannes bateu nomes como Antonioni, Buñuel e Bresson, na premiação norte-americana Duarte acabou derrotado justamente por um francês, Serge Bourguignon, com Sempre aos Domingos (1962). – por Leonardo Ribeiro

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Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964)
É possível compreender uma parte importante da história do cinema brasileiro a partir da lista de indicados do país ao Oscar de filme estrangeiro. Nos anos 60, por exemplo, há uma recorrente presença nessa lista de representantes do Cinema Novo, movimento que emergia como protagonista na cena cultural da época. Mesmo Glauber Rocha, com seu cinema por vezes considerado hermético, teve dois filmes seus selecionados para essa disputa: o excelente O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro (1968) e esta que é uma de suas obras-primas. Trata-se de fato de um filme esteticamente inovador e de difícil digestão para um gosto mais clássico, que incorpora elementos épicos, musicais, das literaturas erudita e popular para construir uma narrativa antinaturalista e alegórica sobre o Brasil. Pode parecer uma aposta arriscada para um prêmio com tendências conservadoras como o Oscar, mas mesmo a Academia abraçou os cinemas novos (e o cinema moderno em geral) na década de 60, premiando ou indicando diretores como Fellini, Bergman e De Sica, este, aliás, cujo Ontem, Hoje e Amanhã foi o vencedor nessa edição da premiação, e indicando repetidamente representantes de um movimento como a Nouvelle Vague tcheca.  – por Wallace Andrioli
 Cena do filme O Caso dos Irmãos Naves

O Caso dos Irmãos Naves (1967)
Além de apresentar uma trama visceral, cuja fotografia e atuações são diferenciais, o filme de Luis Sérgio Person consegue harmonizar uma história biográfica com um comentário político atual, apesar de todas as restrições de censura da Ditadura Militar. Os causos e acusações que Joaquim (Raul Cortez) e Sebastião (Juca de Oliveira) sofrem combinam perfeitamente com os julgamentos do regime militar no ano em que o longa foi lançado. Person se aproveita do fato de tudo ocorrer no período do Estado Novo para mostrar as mesmas barbáries e métodos de tortura semelhantes aos dos governos pós 1964. O Capitão sem nome, interpretado por Anselmo Duarte, é a figura mais notória dessa denúncia, pois reúne não só o comportamento violento típico dos milicos, mas também a manipulação da opinião pública e dos fatos, ao seu bel prazer. Em 1967 o páreo para o Oscar de filme estrangeiro foi duro. Venceu Um Homem, Uma Mulher (1966), de Claude Lelouch. Mas, de certa forma, o cinema político fora representado, uma vez que entre os cinco finalistas ficou o excelente A Batalha de Argel (1966), de Gillo Pontecorvo, que falava de uma tentativa de revolução contra outro governo opressor, ainda que o tom seja bem diferente da película de Person. – por Filipe Pereira

 

O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro (1969)
Este é um dos filmes mais populares internacionalmente de Glauber Rocha. O cineasta venceu por ele o prêmio de Melhor Diretor no Festival de Cannes de 1969, sendo aclamado por gente do porte de Martin Scorsese. Trata-se de uma continuação não totalmente oficial de Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), que retoma o personagem Antonio das Mortes (Maurício do Valle), transformando-o de matador de cangaceiros, a serviço de grandes latifundiários, em justiceiro das misérias do povo, figura revolucionária, ainda que anacrônica no mundo moderno em que é forçado a se inserir. Dono de um visual acachapante, o filme tem uma linguagem um pouco menos árida que a dos dois trabalhos anteriores de Glauber (Deus e o Diabo na Terra do Sol e Terra em Transe), chegando a dialogar com o gênero western. Ainda assim, acabou não entrando na lista final de indicados ao Oscar de filme estrangeiro, num ano em que o vencedor da categoria foi Z (1969), de Costa-Gavras, outro poderoso exemplar de um cinema político extremamente moderno.  – por Wallace Andrioli

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A Hora da Estrela (1985)
A história de Macabéa, a nordestina de dezenove anos que vai morar em São Paulo e vive uma vida sem emoções até namorar Olímpico, já era uma grande narrativa da literatura, um dos títulos mais lembrados da gloriosa Clarice Lispector. A adaptação de Suzana Amaral esmiúça ainda mais a história, mas sem perder seu tom melancólico, um reflexo da vida da protagonista, que tem sua hora do título exposta da forma mais intrigante, surpreendente e, porque não dizer, trágica. Entre cartomantes e a apatia de seu dia a dia, o público contempla o vazio a que estamos todos expostos no cotidiano. Ou simplesmente o aceitando como Macabéa (Marcélia Cartaxo) faz. Vencedor de prêmios nos festivais de Berlim, Havana e Brasília, esta grande obra foi selecionada para concorrer ao Oscar de 1986 de produção estrangeira, mas acabou preterida pelos votantes da Academia, que naquele ano premiaram o argentino A História Oficial (1985). Por sinal, o brasileiro foi o último longa-metragem dirigido por uma mulher a ser escolhido pelo Brasil neste quesito, algo que viria acontecer de novo apenas 30 anos depois, com Anna Muylaert e seu Que Horas Ela Volta? (2015). – por Matheus Bonez

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O Que É isso, Companheiro? (1997)
Com O Quatrilho (1995) tendo sido recém-indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, dois anos antes, nem o cinéfilo brasileiro mais otimista imaginaria que estaríamos novamente tão cedo na festa de Hollywood. Mas aconteceu quando o filme de Bruno Barreto foi escolhido pela Academia para figurar entre os cinco indicados do ano de 1998. Contando uma história baseada em fatos reais, do sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick (Alan Arkin) pelo grupo revolucionário MR-8 durante a Ditadura Militar brasileira, o filme conseguiu conquistar os votantes do Oscar, que conferiram uma história com toques generosos de thriller político e de fácil entendimento para qualquer plateia. Com elenco pinçado a dedo, com destaque para Pedro Cardoso em um raro papel sério, esta foi nossa terceira indicação ao prêmio da Academia (e terceira frustração). Naquele ano, quem se deu bem foi a Holanda com o longa-metragem Caráter (1997), de Mike van Diem, que já havia levado prêmio especial no Festival de Cannes e garantiu a estatueta em cima da Alemanha, Espanha, Rússia e, claro, o Brasil – que estaria de volta na festa no ano seguinte, com Central do Brasil (1998), nossa até agora última indicação nesta categoria. – por Rodrigo de Oliveira

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Central do Brasil (1998)
Vencedor do Urso de Ouro no Festival de Berlim, do Globo de Ouro e do BAFTA de Melhor Filme Estrangeiro, entre outros diversos prêmios e indicações, o longa-metragem de Walter Salles tinha tudo para fazer bonito no Oscar de 1999, levando para casa a primeira estatueta brasileira. Mais um fator enchia a torcida de esperança: Fernanda Montenegro concorrendo na categoria Melhor Atriz, um feito e tanto para uma intérprete trabalhando fora de produções norte-americanas ou, ao menos, faladas em língua inglesa. Foi um grande balde de água fria quando Sophia Loren anunciou a vitória de seu conterrâneo A Vida é Bela (1998), comédia dramática de tintas carregadas, com um tom bastante distinto do da realização brasileira, por sua vez, um drama intimista sobre a busca de um filho pelo pai. Quem perdeu na ocasião foi a própria Academia, que jogou fora a ótima chance de premiar uma produção verdadeiramente importante, que não recorria – assim como o filme de Roberto Benigni – a expedientes fáceis para emocionar a plateia de maneira esquemática. Talvez tenha sido a vez em que o Brasil chegou mais perto de ganhar a tão almejada estatueta. A derrota do longa-metragem de Salles figura no rol das grandes injustiças do Oscar. – por Marcelo Müller

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Cidade de Deus (2002)
Um dos filmes nacionais mais relevantes em aspectos sociais e artísticos desde a retomada do nosso cinema é também uma das obras mais internacionalmente reconhecidas da cinematografia brasileira. Dirigido com maestria e uma inventividade que Fernando Meirelles jamais havia apresentado (ou voltaria a apresentar), este drama envolvente e frenético ainda serviu para introduzir no mundo o “favela movie”, explorado posteriormente à exaustão. Esnobado pela Academia em 2003, quando sequer chegou a ser indicado ao Oscar na categoria de Melhor Filme Estrangeiro – prêmio que acabou nas mãos do apático Lugar Nenhum na África (2003) –  o longa-metragem foi recompensado no ano seguinte com quatro inesperadas nominações: Melhor Diretor (Meirelles), Melhor Roteiro Adaptado (Bráulio Mantovani), Melhor Fotografia (César Charlone) e Melhor Edição (Daniel Rezende). Mesmo que tenha saído da celebração sem qualquer prêmio, a realização fez história em um dos momentos de maior prestígio para uma produção tupiniquim em terras estrangeiras. Méritos não faltam para um filme que ainda é referência, justificadamente reverenciado por suas excepcionais locações e fotografia, pela edição inquieta ou em virtude de sua narrativa imaginativa e repleta de camadas, tão bem coreografadas e arrematadas por um elenco excepcional composto por muitos não-atores. Eis um dos nossos maiores trunfos cinemáticos. – por Conrado Heoli

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O Som ao Redor (2012)
Preterido na disputa deste ano pela vaga brasileira no Oscar, com Aquarius (2016), Kleber Mendonça Filho teve este seu excepcional primeiro longa-metragem de ficção escolhido para a disputa em 2014, após aclamação da crítica e em festivais nacionais e internacionais. Apesar de não ter chegado à lista final de indicados, num ano em que o vencedor foi o italiano A Grande Beleza (2013), o filme de Kleber tem qualidades suficientes para representar lá fora a potência do cinema brasileiro contemporâneo: possui um forte discurso social, um interessantíssimo vínculo com o gênero horror e uma narrativa que escapa de obviedades ao traçar um panorama crítico da classe média alta recifense e dos vínculos entre a propriedade imobiliária atual dessa classe, aparentemente moderna, e o latifúndio de outrora, que remete à escravidão. O resultado é politicamente explosivo, mas muito sofisticado, já que não apela para didatismos ou posturas panfletárias – ainda que o diretor e roteirista não abra mão de marcar posição no debate que está propondo.  – por Wallace Andrioli

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Que Horas Ela Volta? (2015)
Premiado no Festival de Sundance, o filme escrito e dirigido por Anna Muylaert fez uma boa carreira internacional antes de debutar no Brasil, na abertura do Festival de Gramado de 2015. Desde então, favorito para concorrer a uma vaga na festa da Academia, o longa-metragem confirmou este favoritismo alimentado pelo boca-a-boca e a opinião especializada. A história mostra Val (Regina Casé), empregada doméstica que precisa abrigar a filha, Jéssica (Camila Márdila), na casa de sua patroa, Bárbara (Karine Teles). A relação orgânica de chefe e serviçal, que existia antes, é então abalada pelas opiniões e atitudes da hóspede que se recusa a deixar que a etiqueta e as convenções sociais a impeçam de ser tratada como qualquer um. O filme, portanto, além de protagonizado com talento por Márdila e Casé, ainda levanta questões importantes sobre luta de classes e mesmo o empoderamento feminino. Dono de um roteiro inteligente e honesto, o projeto com certeza deveria ter estado entre os finalistas, e talvez galgado espaço também entre as candidatas a Melhor Atriz no Oscar. A estatueta de Melhor Filme Estrangeiro de 2015 acabou nas mãos do húngaro Filho de Saul.– por Yuri Correa

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
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