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Sinopse

Depois de se aventurar pelo mundo, o explorador inglês Percy Fawcett está atrás de uma cidade perdida feita de ouro no coração da Amazônia. Nesta jornada, contará com o apoio da sua ​esposa, do filho, e de um ajudante.

Crítica

Na primeira vez em que Percy Fawcett (Charlie Hunnam) retorna à Inglaterra para relatar sua incursão repleta de contratempos pela selva Amazônica, este oásis de perigos e mistérios no coração da América do Sul, os acadêmicos fazem pouco de sua visão entusiasmada. Recusando-se a chamar os nativos de selvagens, o militar afronta ferozmente o eurocentrismo. Z: A Cidade Perdida é o retrato de sua obsessão, não necessariamente cuja finalidade é a glória, embora tal ambição motive inicialmente a busca por algo novo. O protagonista é um homem de habilidades reconhecidas, mas a ascendência pouco nobre e o fato de ser filho de alguém que caiu em desgraça lhe trazem sérias desvantagens. Na coletividade inglesa do começo do século XX, a posição social definia os exitosos, ditava quem tinha alcançado certa relevância e os que deveriam contentar-se com a admiração dos celebrados feitos alheios. Mesmo tendo o respeito dos subalternos, faltam a Percy as honrarias efêmeras das medalhas no peito.

A suntuosidade visual de Z: A Cidade Perdida está a serviço da história, das narrativas que se desenvolvem tanto no seio da floresta quanto nos regressos de Percy ao convívio com a família. O cineasta James Gray, considerado por muitos um dos grandes artífices norte-americanos, faz seus personagens transitarem por ambientes permanentemente escuros, emulando devidamente a iluminação precária da época, sem as possibilidades da energia elétrica. Num ritmo caudaloso, como convém ao rio onde boa parte da trama se passa, o filme desenha um íntimo contato entre o homem branco, europeu e, portanto, criado em meio à errônea ideia de superioridade diante de outras raças, e o índio. Com o passar do tempo, a missão topográfica que visava arbitrar o conflito entre Brasil e Bolívia por território se transforma numa determinação existencial, que concerne mais ao explorador que à mata, este espaço de vastidão ameaçadora, cenário, inclusive metafísico, que expande o escopo da abordagem.

Gray demonstra exímia perícia ao fundir simbolicamente as paisagens externas e internas, ora deflagrando a pequenez dos personagens diante da magnitude da natureza, ora ressaltando a prevalência da bravura humana, do seu instinto de investigação e desbravamento. Os indígenas oferecem ao protagonista, bem como aos colegas expedicionários, entre eles aquele que se torna seu melhor amigo e escudeiro, Henry Costin (Robert Pattinson), a esfera do desconhecido que, ao mesmo tempo, fascina e amedronta. Z: A Cidade Perdida adquire matizes distintos quando Percy está em casa, na companhia da família, então mantida corajosamente pela esposa, Nina (Sienna Miller). Nesses momentos, o cineasta desenvolve habilmente as relações influenciadas pela ausência frequente do patriarca, voltando-se às particularidades da ligação sanguínea, elemento recorrente em sua filmografia, aqui alçado à primeira grandeza quando o filho de Percy, Jack (Tom Holland), decide acompanhá-lo floresta adentro.

Z: A Cidade Perdida é mais afeito à contemplação que necessariamente à ação, embora esta esteja presente, especialmente nos instantes em que a vida parece frágil. James Gray cria uma atmosfera complexa, a despeito do primitivismo deflagrado no contato com a Amazônia profunda. Determinadas passagens exalam poesia, como o vislumbre literal e improvável de uma ópera no meio do nada ou a contemplação aparentemente banal do cultivo da terra por parte de seus guardiões. Encontrar Z, a tal cidade adornada de ouro e avançada em tantos aspectos, isso de acordo com as lendas, é uma utopia e, como tal, evidentemente inalcançável ao aventureiro vivido com muita competência por Charlie Hunnam, ator que demonstra bastante talento. Neste filme visualmente exuberante e dramaticamente intrigante, a impossibilidade se instaura no cerne do desejo humano, provocando uma dicotomia, pois pode tanto levar o homem à ruína quanto prover-lhe sentido à vida, assim como todas as paixões.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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