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Sinopse

Um grupo de agentes humanitários tenta remover um cadáver de um poço numa zona de conflito armado. O corpo foi deixado ali para contaminar a água e cortar o fornecimento à população local. Mas as circunstâncias transformam a tarefa aparentemente simples numa missão praticamente impossível. Humor, drama, carinho, rotina, perigo, esperança: tudo cabe num dia perfeito.

Crítica

Remover o corpo morto que empesteia um poço artesiano na região convulsionada dos Balcãs, mais precisamente na Bósnia, se converte na missão principal de um grupo multinacional de agentes humanitários em Um Dia Perfeito. As terras, em estado de crise por conta da guerra que, então, finalmente ensaia acabar, estão repletas dessas insólitas situações, heranças nefastas de um período marcado pela destruição. O calejado Mambrú (Benicio Del Toro) tem a ingrata tarefa de liderar e, ao mesmo tempo, de zelar pela segurança da equipe, justamente num espaço volátil, um campo minado, literal e simbolicamente falando. Seu contraponto é o colega B (Tim Robbins), ele que faz da intuição o protocolo a ser seguido, até quando atitudes podem resultar na detonação de bombas. O contexto geopolítico se apresenta num nível subjacente, servindo de tempero superficial à trama, não determinando estritamente seus rumos, o que denota a intencionalidade do pouco aprofundamento na seara sócio-política.

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Um Dia Perfeito é uma comédia dramática, às vezes reticente demais frente às possibilidades de abraçar plenamente a primeira de suas vocações naturais. Na interação entre os personagens de Del Toro e de Robbins é que melhor se delineiam os momentos engraçados, feitos de tiradas espertas, num itinerário em que o humor alimenta uma ironia desiludida. Eles sabem que nada podem fazer para estancar o sangramento daquela área, a não ser, talvez, perseverar, exercendo seu trabalho da melhor maneira, auxiliando cotidianamente o próximo. O diretor Fernando Léon De Aranoa, contudo, não estende a, neste caso, bem-vinda alternância de registros, entre o cômico e o dramático, às outras pessoas, o que reduz seus destaques. Mélanie Thierry interpreta Sophie, francesa que inicialmente não se encaixa no modus operandi dos veteranos, demonstrando insatisfação, por exemplo, quando um deles passa por cima do cadáver de uma vaca, pela simples incapacidade de decidir como contorna-lo.

Ainda sobre os personagens, Katya (Olga Kurylenko), que poderia ser o elemento estranho aos procedimentos dos demais, não consegue cumprir essa função, tampouco a de agente desestabilizador em virtude do caso amoroso que manteve no passado com um dos homens tarimbados. Damir (Fedja Stukan) não tem qualquer peso maior, servindo apenas como ponte linguística entre os estrangeiros e os locais, ou seja, limitando-se tão e somente ao seu papel profissional. As conjunturas se acumulam em Um Dia Perfeito sem fundamentalmente constituir um encadeamento interessante. Embalado por uma boa trilha sonora, na qual predomina o rock and roll, o longa-metragem se desenvolve numa sucessão de momentos em que se pretende mostrar as agruras da guerra por meio de um viés relativamente leve, mesmo que Aranoa não se furte de deflagrar alguns efeitos-colaterais trágicos, como visto na ocasião em que a trupe consegue a corda necessária ao içamento do inanimado convertido em MacGuffin.

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O andamento morno da narrativa é compensado por Benicio Del Toro e Tim Robbins, cujas atuações evitam que o todo caia inapelavelmente no marasmo. Eles são responsáveis pelas cenas mais interessantes. Robbins, principalmente, concebe um personagem bastante carismático em meio aos desempenhos monocórdicos de boa parte dos coadjuvantes. Falta tônus à tragicomédia que transcorre na tela, algo evidenciado na subtrama centrada no menino que espera ganhar uma bola. O diretor Fernando Léon De Aranoa não explora a contento essa presença essencialmente fragilizada pelo abandono – uma constante em territórios assolados por conflitos, sejam eles de que natureza forem –, fazendo dela somente outro dado de curiosidade inserido desajeitadamente num entorno repleto de singularidades. Mesmo que tenha seu charme, Um Dia Perfeito possui um périplo burocrático, salvo aqui e acolá por iniciativas e talentos destoantes da preguiça predominante.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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