Crítica

Grande sucesso de bilheteria na Argentina, Um Conto Chinês chegou ao Brasil enaltecendo o fato de ter somado mais de um milhão de espectadores nas bilheterias do seu país de origem. É um número que impressiona, ainda mais se lembrarmos que a população argentina é cerca de 4 a 5 vezes menor que a brasileira. E em comparação, menos de 5% dos filmes nacionais conseguem ultrapassar essa marca em nosso território – agora, os que conseguem, chegam a atingir a quantia de 3, de 5 ou até mesmo de 11 milhões de pessoas, como foi o inacreditável feito alcançado por Tropa de Elite 2. Mas, com exceção desse e de um ou outro, a maioria dos longas brasileiros que se tornam favoritos de público deixam muito a desejar em suas relações com a crítica. A boa notícia, ao menos nesse caso, é que a mesma sina não se repete.

Muito tem se falado que o principal mérito das produções argentinas são seus roteiros, humanos e verdadeiros, emocionantes e envolventes. Pois esse Um Conto Chinês possui tudo isso e mais um grande aliado: a presença de Ricardo Darín como protagonista. Ele pode ser considerado o Robert De Niro – ou seria o George Clooney? – do cinema platino! Tudo o que faz possui uma qualidade singular, agindo como uma garantia de boas histórias e de filmes acima da média. Estão no seu currículo o vencedor do Oscar O Segredo dos Seus Olhos (2009) e o indicado O Filho da Noiva (2001), além do ágil Nove Rainhas (2000), do polêmico XXY (2007), do pesado Abutres (2010) e do saudosista Clube da Lua (2004), dentre tantos outros. E dessa vez ele se reinventa novamente, deixando de lado o ar de galã irresponsável para compor um tipo único, divertido e carismático em sua casmurrice, repleto de manias aparentemente tolas, mas todas donas de uma verdade só dele. E o prazer de ir desvendando-o aos poucos, como camadas de uma cebola, é raro e prazeroso.

Um Conto Chinês parte de um fato absurdo e verídico, tão inacreditável que só poderia ser verdadeiro. No meio da China, um rapaz decide pedir sua namorada em casamento durante um passeio pelo barco. Estão somente os dois na pequena canoa, durante uma tarde calma e tranquila. Até que uma vaca literalmente cai do céu exatamente em cima deles, matando a moça e deixando o namorado completamente sozinho no mundo. Como o animal foi surgir dos céus é outra história, e muito da crença de que, sim, é possível que um episódio tão insólito quanto esse aconteça, está a base da trama. Logo em seguida vemos o mesmo jovem desembarcando em Buenos Aires, sem saber falar uma só palavra em espanhol. Ele acaba conquistando as graças de Roberto (Darín), o solteirão e ranzinza dono de uma ferragem que ao tentar ajudá-lo só consegue aumentar gradativamente a confusão do seu dia a dia. E os dois, mesmo sem conseguirem se comunicar verbalmente, irão mudar de forma definitiva a vida um do outro.

Assim como muitos dos filmes argentinos, Um Conto Chinês parece ser uma coisa, mas depois revela-se outra. Parece ser uma comédia besteirol – e, partindo de um argumento como esse, se fosse uma produção hollywoodiana certamente seria. Mas há um carinho e uma preocupação muito grande com os personagens aqui, e os risos, no início surgidos da incredulidade, logo serão substituídos por um olhar mais enternecido, por um entendimento mais humanista e pela certeza de que somos todos iguais, independente das nossas inúmeras diferenças. Se à princípio parece ser um longa de uma piada só, essa sensação aos poucos é deixada de lado, e mesmo o ritmo um pouco lento durante o seu desenvolvimento é superado por uma conclusão que pouco diz, mas mostra absolutamente tudo. Mais uma aula de cinema de cortesia dos nossos hermanos. Gracias!

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