Crítica

Os imigrantes japoneses, que ajudaram a tornar grande e rentável a agricultura no interior de São Paulo, deixaram marcas que vão além dos traços de seus descendentes nascidos em terras brasileiras. O resultado é uma mistura da cordialidade oriental com o calor humano típico dos latino-americanos. Com foco nas lembranças de quem deixou o outro lado do mundo para conquistar uma vida mais confortável no Brasil, o diretor Paulo Pastorelo criou Tokiori: Dobras do Tempo, documentário que tem como cenário principal a comunidade rural de Graminha, localizada próxima à cidade de Marília.

Pastorelo se propõe a traçar a história das cinco famílias japonesas que colaboraram para tornar a região uma das mais férteis para o café nas décadas de 20 e 30. Porém, seu foco não está no processo de imigração, mas na construção de uma verdadeira família. A narração em off no início do filme descreve o olhar infantil sobre uma festa na fazenda, em que todos os convidados eram imigrantes e, de certa forma, parentes. A ideia de que japoneses eram iguais se encaixa aqui não como preconceito, mas como sobrevivência. Juntas e realizando casamentos entre si, os parentes diminuíam a falta da terra natal.

As constantes e desejadas viagens entre Japão e Brasil dos pais de Yoshie Sato, de 90 anos, são traduzidas em fotos e cartas repletas de elogios aos familiares japoneses e também promessas de uma volta definitiva à terra do sol nascente. Por ter chegado ao Brasil com apenas nove anos, Yoshie cresceu acompanhando as mudanças políticas e econômicas do país de forma singular, já que era uma criança japonesa criada num lugarejo brasileiro. As paisagens se mesclam ao longo de Tokiori: Dobras do Tempo e o diretor faz disso uma poesia com a cara da nossa nação. Suas lembranças de infância se combinam com acontecimentos felizes e trágicos da comunidade japonesa de Graminha.

Em alguns planos, o documentário toca o cinema japonês clássico, como no da entrevista com um casal de idosos no Japão relembrando as cartas dos familiares que foram construir suas vidas no Brasil. A câmera rente ao chão, seguindo o estilo do cineasta Yasujiro Ozu, agrega mais significado às histórias, sempre permeadas por silêncios longos, bem ao gosto oriental. Tokiori: Dobras do Tempo não é apenas um retrato da imigração japonesa no Brasil. É uma amostra de como um povo que veio de tão longe se integrou à nossa cultura sem abandonar a saudade do lado de lá.

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é jornalista e especialista em cinema formada pelo Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Com diversas publicações, participou da obra Uma história a cada filme (UFSM, vol. 4). Na academia, seu foco é o cinema oriental, com ênfase na obra do cineasta Akira Kurosawa, e o cinema independente americano, analisando as questões fílmicas e antropológicas que envolveram a parceria entre o diretor John Cassavetes e sua esposa, a atriz Gena Rowlands.
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