Crítica

Produção selecionada para o Festival de Sundance de 2016, ovacionada durante e após o evento, The Fits trata de Toni (Royalty Hightower), uma moleca, pré-adolescente que auxilia seu irmão durante algumas aulas de boxe numa academia. Próximo do local, um grupo de garotas organiza um time de competições de dança, pelo qual ela logo se interessa. Tal universo contrasta com o seu: é feminino e repleto de códigos que ela desconhece. Aos poucos, Toni começa a absorvê-lo e a se sentir confiante, ao ponto de integrar os treinos e as competições. Porém, ao passo em que faz essa transição para as aulas, uma praga sobrenatural parece se instalar no time, fazendo com que as garotas convulsionem e tenham experiências transcendentais.

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No filme, o adolescer de Toni é retratado como um suspense. Constantemente a protagonista é mostrada como uma invasora em território inimigo. É uma belíssima metáfora para se refletir sobre a transição da pré-adolescência ou da infância à adolescência, época que pode ser aterrorizante para qualquer um. Amadurecer nunca é fácil, e, muitas vezes, The Fits é um filme que claramente explora o sobrenatural e o inexplicável. A diretora Anna Rose Holmer se vale dessa mudança como um mundo desconhecido e adiciona certos floreios de suspense associados a uma fotografia belíssima. São enquadramentos e planos impactantes. Holmer parece criar um filme preocupado com profundidade de campo, perspectivas e linhas. É algo digno de vídeo arte, em alguns momentos ou de fashion films.

Talvez por se aproximar tanto de um cinema de arte, The Fits peque consideravelmente em criar um ritmo adequado ao gênero cinematográfico proposto. As referências, muito adequadas, são similares às do cinema da francesa Céline Sciamma, de Tomboy (2011) e Garotas (2014), mas não ajudam a diretora a criar uma narrativa dinâmica e objetiva. Mesmo com belos números de dança e a ótima opção por menos diálogos, a falta de pontos-de-virada interessantes ou impactantes torna o filme arrastado. Poderia ser um média ou curta-metragem. Mesmo que o tempo sirva, mais uma vez, como metáfora, o resultado é um tanto quanto monótono.

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Porém, sabendo que possui um grande trunfo, a atuação da excepcional Royalty Hightower, Holmer intensifica a participação da atriz a cada cena. É um banho de interpretação e carisma. As expressões que Hightower traz junto do sentimento de insegurança e inadequação da personagem poderiam render estatuetas, isso se bem divulgados para uma temporada de premiações. Vale ressaltar a emblemática cena final, com uma coreografia e olhares diretos da atriz para a câmera, que é de arrepiar. Mesmo pecando por um ritmo inadequado, The Fits traz temáticas importantíssimas para o cenário atual como a representação da mulher negra e também os papéis de gênero que a sociedade impõe. Por isso, já vale, e muito, conferi-lo.

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é graduado em Cinema e Animação pela Universidade Federal de Pelotas (RS) e mestrando em Estudos de Arte pela Universidade do Porto, em Portugal.
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