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Sinopse

Depois de ter largado a família para se transformar numa estrela do rock, Ricki retorna para sua casa em Indiana a afim de tentar se reaproximar dos filhos e do ex-marido.

Crítica

São tantos os elementos problemáticos em Ricki and the Flash: De Volta pra Casa que é preciso ir com muita calma na hora de uma análise mais detalhada sobre o filme. Primeiro, vamos pelo título: ainda que o adendo genérico do batismo nacional seja à primeira vista sofrível, causa surpresa quando percebemos que o longa em questão tem muito mais a ver com este acréscimo do que com a denominação original. Em seguida, nomes como os dos oscarizados Jonathan Demme (diretor) e Diablo Cody (roteirista) até impressionam, mas é preciso um distanciamento para observar o quão distante ambos estão de seus melhores momentos. Mas nada disso importaria se a protagonista, a diva Meryl Streep, entregasse – como de costume – um show de interpretação e versatilidade. Infelizmente, não é o que acontece.

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Ricki é o nome da roqueira interpretada por Meryl, e The Flash é sua banda, liderada pelo namorado Greg (o músico de verdade Rick Springfield, em seu primeiro papel de destaque no cinema desde... Um Homem Impossível de se Amar, de 1984!). Ricki and the Flash não se trata, no entanto, da história de uma mulher que abandona sua família para seguir a carreira como cantora, se unindo a outras pessoas que compartilham do mesmo sonho e as dificuldades que juntos enfrentam em busca da fama. Muito pelo contrário. Quando a encontramos, já percebemos o ar de decadência ao seu redor, se apresentando em bares para públicos de não mais do que dez pessoas, ao mesmo tempo em que consegue se sustentar trabalhando durante o dia como caixa em um supermercado. É quando entra em cena o De Volta pra Casa, dando origem à ação que irá conduzir a história: sua filha, a quem há anos não vê, foi traída e abandonada pelo marido, e no auge da depressão tenta suicídio. O pai dela – e ex de Ricki – chama a mãe da garota para ajudá-la em sua recuperação. O reencontro será motivo suficiente para que muitas amarguras e desilusões venham à tona, em um processo que, como todo bom e velho exemplar da Sessão da Tarde já cansou de mostrar, servirá apenas para reatar os laços desgastados.

Demme – vencedor do Oscar por O Silêncio dos Inocentes (1991), mas que não lançava um longa de destaque desde O Casamento de Rachel (2008) – volta a trabalhar com Meryl, a quem dirigiu no inquietante Sob o Domínio do Mal (2004). Distante da antagonista manipuladora que interpretava neste thriller político conspiratório, a atriz pouco tem a fazer desta vez, além de assumir um figurino escandaloso e defender com entusiasmo uma guitarra. As cenas que divide com a filha Mamie Gummer (sua herdeira na vida real) se revelam, no entanto, muito aquém do que um encontro como esse poderia prometer. A garota não tem metade do talento da mãe, e o papel que lhe é oferecido certamente não é dos mais felizes. Tanto que os dramas que ambas dividem são resolvidos facilmente, após uma ida ao cabeleireiro, um sorvete e duas rápidas discussões. Kevin Kline, que foi par de Streep no emblemático A Escolha de Sofia (1982), é outro que tem pouco a sua disposição – nem a cena em que dividem um cigarro de maconha chega a ser engraçada, certamente muito aquém daquela entre ela e Steve Martin em Simplesmente Complicado (2009).

Os textos inteligentes e os diálogos rápidos que surpreenderam em Juno (2007) há muito mostraram ser uma promessa vã, e Diablo Cody segue um caminho seguro, sem se arriscar em nenhum momento. Nem o reencontro com os demais filhos durante um jantar, em que todas as tensões familiares se encontram à beira de uma explosão, chega a movimentar o quadro, deixando saudades do clímax tempestuoso de Álbum de Família (2013) – em que Meryl dominava a cena em uma situação bastante similar. Chegou a virar meme a frase do seriado Modern Family (2009-) em que um personagem afirma, no auge do seu fanatismo pela atriz, que ela seria capaz de interpretar com perfeição até mesmo o herói Batman. Talvez o problema de Ricki and the Flash seja justamente esse: Meryl Streep já fez de tudo, e sempre muito bem. Quando entrega algo leve e despreocupado, em que esforço algum se percebe durante todo o seu desenvolvimento, o julgamento em comparação será, inevitavelmente, severo demais.

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Entre soluções superficiais e uma irritante distribuição de cotas que visa agradar a todos sem se especificar em ninguém – a nova esposa do pai é negra, assim como um dos filhos é gay, que, obviamente, namora um oriental – Demme, Cody, Streep e companhia fazem de Ricki and the Flash um filme que não é nem mesmo divertido. E para quem for vê-lo interessado na alma musical da atriz, muito mais indicado é ir atrás da trilha sonora do longa (que contém todas as canções por ela defendidas em cena) ou conferir qualquer um dos outros trabalhos anteriores em que ela defendeu seus dotes como cantora com muito maior sucesso, como Mamma Mia (2008), Caminhos da Floresta (2014), Lembranças de Hollywood (1990) ou até mesmo Ironweed (1987), apenas para ficarmos nos mais óbvios.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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