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Sinopse

Um casal tenta superar a morte prematura do filho pequeno. Howie ainda está apegado às coisas do menino. Já Becca preferia vender tudo e começar logo um novo capítulo de suas vidas. As coisas se complicam quando ele começa a ter um caso e ela vai em busca dos pais do adolescente que provocou a tragédia.

Crítica

O bizarro título brasileiro para Rabbit Hole não poderia estar mais longe do que é mostrado no filme. Se existe algum reencontro na produção assinada por John Cameron Mitchell é o de Nicole Kidman com um bom personagem. Vivendo uma mãe perdida pela morte do filho, a atriz emociona com sua atuação e é um dos destaques de Reencontrando a Felicidade. Com roteiro de David Lindsay-Abaire (Coração de Tinta, 2008), baseado em sua própria peça de teatro, o longa-metragem conta a história do casal Becca (Kidman) e Howie (Aaron Eckhart, de Batman: O Cavaleiro das Trevas, 2008), que tenta conviver com o fato de terem perdido seu único filho, Danny, com apenas 4 anos de idade. Oito meses depois da fatalidade, a convivência na casa é cada vez mais insuportável e até um grupo de ajuda é tentado pelo casal. Acompanhamos o cotidiano de ambos, cada um encarando da sua maneira a dor da ausência.

Não existe tristeza maior que a perda de um filho. Se essa frase é senso comum, existe motivo. John Cameron Mitchell é hábil em conseguir mostrar ao espectador a dor pela qual seus personagens passam. E nunca de forma óbvia. O roteiro da trama vai desvelando os acontecimentos aos poucos, nunca parecendo que estamos vendo diálogos meramente expositivos. Se o casal conversa sobre sua perda, é porque, na vida real, isso realmente aconteceria. Por falar em vida real x ficção, o cineasta consegue misturar as atuações naturalistas, tão caras à Hollywood, com pequenos momentos corriqueiros, imitando o cotidiano de pessoas normais. Está longe de ser uma produção realista, claro. Mas Mitchell se dá ao luxo de incluir cenas que, aparentemente, são prosaicas – como o marido ensinando a esposa a mexer no seu celular ou conversas soltas entre sogra e genro durante uma festa de aniversário. Claro que estas passagens têm um porquê, mas são incluídas de forma tão natural que parecem excertos da vida real apenas, sem motivo.

É possível sentir a angústia do casal e isto só se dá pelas belas atuações de Nicole Kidman e Aaron Eckhart. Como dito anteriormente, ambos convivem com a dor de formas diferentes. Becca pensa que desapegar-se do filho em parcelas, dando suas roupas, escondendo fotos e mudando de casa, é a melhor solução. Enquanto isso, Howie tem maiores dificuldades em deixar o filho no passado. Por isso, sempre assiste a antigos vídeos e ainda carrega em seu carro o assento da criança, talvez como forma de trazer seu filho novamente para seu cotidiano. Com duas maneiras tão distintas de enxergar a perda, é lógico que é criado um grande abismo entre o casal. Kidman e Eckhart conseguem transmitir esse distanciamento para o espectador – sempre deixando bem claro que o amor entre os dois não terminou. Apenas transformou-se em outra coisa após a tragédia.

Becca tem a mãe, Nat (Dianne Wiest, de Passageiros, 2008), e a irmã, Izzy (Tammy Blanchard, de O Homem que Mudou o Jogo, 2011) para darem uma força durante esse momento difícil. Mas com a paciência esgotada, fica bastante difícil qualquer relação entre elas. Nat, em uma atuação formidável de Wiest, só faz comparações entre a dor que sentira ao perder seu filho e a morte de Danny, o que deixa Becca irritadíssima. Dianne Wiest consegue acertar em cheio na composição de mãe compreensiva e um tanto quanto fora de órbita. Já Izzy está grávida, o que também se torna um assunto complicado. O nascimento de um bebê só lembra a Becca o fato de ter perdido o seu. Nicole Kidman faz uma dobradinha ótima com Aaron Eckhart. Mas emociona mesmo nas cenas divididas com o jovem e talentoso estreante Miles Teller. Para não revelar muito da trama, digamos apenas que eles dividem uma história traumática e o encontro entre os dois poderá trazer algum conforto (e certo conflito) em suas vidas. Os diálogos são, de novo, corriqueiros, mas cheios de pesar e de lembranças tristes. Para os mais sensíveis será difícil segurar as lágrimas.

O desfecho, muito bem construído, não dá espaço para mágicas recuperações, transformando este filme em um retrato bastante verdadeiro de um momento difícil na vida de um casal. Uma história melancólica e intimista não parecia uma escolha óbvia para um diretor que tem em sua ficha corrida filmes diferentes e polêmicos como Hedwig: Rock, Amor e Traição (2001) e Shortbus (2006). Isso não se mostra problema em momento algum. Muito pelo contrário. Usando seu olhar off Hollywood em uma trama com atores conhecidos, John Cameron Mitchell realiza um longa-metragem diferente do que um diretor mainstream faria, mas com apelo suficiente para chamar atenção de um grande público. Um equilíbrio invejável, alcançado neste Reencontrando a Felicidade.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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