Crítica

O cinema de Helena Ignez exala transgressão, e não é à toa. Afinal, são características da gênese de seu trabalho como atriz no cinema marginal e de sua relação com cineastas como Rogério Sganzerla e Glauber Rocha, com os quais foi casada. Em seu mais recente longa, Ralé, Ignez apresenta uma proposta que busca, como já esperado, fugir do óbvio e dos padrões em uma adaptação bem livre, moderna e descontruída do texto de mesmo nome do escritor russo Máximo Gorki (A Mãe, 1906).

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Anárquica por excelência, a diretora conta a história de um barão (Ney Matogrosso) que, após se aposentar dos seus dias de libertinagem e drogas, funda uma seita religiosa baseada no chá alucinógeno de São Daime. Sem dar diretrizes e longe de uma linguagem didática ao espectador, Ignez trilha o caminho pelas diversas pessoas que foram influenciadas pelo tal barão, inclusive sua personagem.

Na narrativa fragmentada, a realizadora fala sobre velhice, liberdade e aceitação sexual. É um filme libertário e, como é dito durante a projeção, “polêmico e amoral”. Enquanto uma atriz (Simone Spoladore) atua em um filme dirigido pelo mais novo prodígio do cinema mundial, o Barão e seu marido bailarino são unidos em uma cerimônia de casamento por um “padre” transexual. Principalmente com intepretações boas de Matogrosso, que repete a parceria com a diretora iniciada em Luz nas Trevas; A Volta do Bandido da Luz Vermelha (2010), e de Djin Sganzerla, que se destaca com uma deliciosa naturalidade. Aliás, alguns dos grandiosos momentos do filme se valem de canções de Ney Matogrosso, que as interpreta nesse pequeno teatro no campo montado pelo seu personagem.

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Com um olhar maduro e objetivo entre seus segmentos, Helena Ignez corresponde às expectativas mesmo quando Ralé perde um pouco do caminho e se torna um tanto cansativo. Mesmo assim, a diretora imprime sua personalidade e loucura marginal em um filme que está longe de ser polêmico, mas é, com certeza, deliciosamente amoral.

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é graduado em Cinema e Animação pela Universidade Federal de Pelotas (RS) e mestrando em Estudos de Arte pela Universidade do Porto, em Portugal.
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