Puro
Crítica
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Sinopse
Katarina é uma jovem de 20 anos de idade. Com um passado conturbado em um subúrbio triste, sua vida já parece definida - até que ela descobre na música uma salvação. Tudo muda quando ela ouve uma apresentação do Réquiem de Mozart na Sala de Concertos de Gotemburgo, que lhe transforma. Entusiasmada, Katarina descobre no maestro Adam uma oportunidade de ingressar neste universo, uma realidade mais interessante do que jamais imaginou. No entanto, toda a sedução de suas novas vivências também lhe traz uma série de dificuldades.
Crítica
O filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard é citado em Puro a partir da máxima “a coragem é a única medida da vida”. Para Katarina, jovem que vive à margem de Gotemburgo, na Suécia, coragem e filosofia soam distantes de seu sofrido cotidiano ao redor de uma mãe alcóolatra, um namorado omisso e a falta de quaisquer perspectivas para sua vida. Isso até que ela, ao acaso, descobre em Mozart um estímulo invisível para penetrar num mundo que não lhe parecia existir.
A essência de Puro não está distante da obra Pigmalião, de George Bernard Shaw, mas funciona como uma versão muito mais cruel e melancólica desta. Na história, levada às telas no delicioso Minha Bela Dama (1964), de George Cukor, um professor esnobe oferece a cultura e a sofisticação da alta sociedade para uma pupila ignorante. No drama sueco, Katarina conhece o maestro Adam e absorve entusiasticamente tudo o que ele lhe apresenta – além de Kierkegaard, Beethoven, o poeta Gunnar Ekelöf e o maestro austríaco Herbert Von Karajan, que a fascinam. A jovem de 20 anos retribui ao se entregar para Adam sem medo algum de corpo e alma, literalmente. Dizer que ele é casado já permite uma compreensão acerca dos inconvenientes gerados a partir do encontro dos dois.
Lisa Langseth fez sua estreia na direção com Puro ao adaptar uma peça teatral de autoria própria, que inclusive já havia sido montada com Noomi Rapace como protagonista – atriz que despontou no cinema a partir da versão sueca de Os Homens Que Não Amavam as Mulheres (2009). Langseth foi perspicaz ao desenvolver sua trama num roteiro polido e silencioso, sagaz ao permitir que a força de seu filme apareça justamente nos diálogos e ações de seus personagens e na atuação de seu casal protagonista, brilhantemente interpretado por Alicia Vikander e Samuel Fröler. A direção da cineasta, econômica e segura, demonstra mais a maneira contida de privilegiar grandes histórias – escolha comum a grandes conterrâneos de Langseth, como Ingmar Bergman e Jan Troell – do que um possível receio de errar.
Os atores de Puro mereceriam um artigo à parte. Samuel Fröler apresenta a maturidade de um intérprete que compreende e respeita a verdade de seu personagem – assim como às difíceis transformações que o mesmo sofre durante o arco narrativo de Puro. Alicia Vikander, por sua vez, revela segurança e domínio surpreendentes para alguém pouco mais velha que a garota que retrata. A atriz entende a complexidade emocional de Katarina e a desenvolve de maneira contida e pontual, evidenciando a volubilidade da jovem no inconstante período de sua vida. Os enquadramentos de Langseth privilegiam uma capacidade nata da atriz, que tem o dom de parecer deslumbrante em uma cena para, segundos depois, se transformar em alguém frágil e destrutível, passível de grande pena. Alicia Vikander deve em breve ser revelada ao mundo, talvez já a partir de sua participação em Anna Karenina (2012), de Joe Wright.
Retomando o filósofo que abre o texto, Kierkegaard também já registrou que “ousar é perder o equilíbrio momentaneamente. Não ousar é perder-se”. Feliz da cineasta Lisa Langseth, que ousou realizar um drama denso como Puro e fez de seu primeiro filme uma grande obra, que merece ser descoberta.
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