Crítica

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Criatividade é importante na hora de conceber uma obra com orçamento diminuto. Com isso em mente, o diretor indiano radicado no Canadá Gaurav Seth construiu um thriller claustrofóbico e com uma história que sugere a destruição de boa parte do planeta. Mas como fazer isso sem o dinheiro para mostrar explosões e eventos cataclísmicos? Basta confiar na imaginação da plateia e construir um filme que utiliza de suas limitações como um predicado, não como um problema. Assim surgiu Prisioneiro X, um dos destaques da edição 2016 do Festival Internacional de Cinema Fantástico de Porto Alegre, o Fantaspoa.

Na trama, baseada na novela Truth, de Robert Reed, o prisioneiro X do título é Ramiro (Romano Orzari), um homem que supostamente veio do futuro e, desde que surgiu na frente do agente Fischer (Damon Runyan), tem se mostrado tão esperto quanto perigoso. Quinze anos se passam desde a captura de Ramiro até o momento em que ele conhece outra agente, Carmen (Michelle Nolden), chamada ao local onde o prisioneiro é mantido em cativeiro, um bunker de segurança máxima. A presença daquela mulher é uma tentativa de Jefferson (Julian Richings), um dos manda-chuvas do local, entender o que aconteceu com Fischer, encontrado morto em seu quarto, tendo aparentemente cometido suicídio. Para Carmen, que o conhecia do passado, o cenário é perturbador. Com passado sombrio, sendo responsável por torturas, aquela mulher conhecerá aquela figura misteriosa e passará a jogar um perigoso jogo de xadrez com Ramiro, no qual apenas o mais frio sairá vencedor.

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A criatividade mencionada no começo do texto é vista em diversos momentos do filme. Repare que quando a televisão dentro da história fala sobre acontecimentos reais do nosso mundo, as imagens não são mostradas – a produção não tinha dinheiro para comprar cenas da CNN ou canais de notícias. Com isso, foi criado o som apenas, para dar uma ideia do ocorrido. Outro exemplo é o bunker, construído em um porão de um estúdio cinematográfico, conseguido de graça pelo diretor.

Com poucos personagens e muita vontade de contar uma história claustrofóbica, Prisioneiro X fala sobre a paranoia, algo que acomete os dois agentes responsáveis pela investigação principal. Essa semente é colocada pelo misterioso Ramiro, que entende que para vencer o jogo, precisa de uma vantagem. Quando Carmen descobre essa artimanha, utiliza um advento parecido para reverter seu jogo. O interessante neste longa-metragem é a ausência da bondade. Não existem personagens bonzinhos. Todos eles são cinza, carregando um peso do passado que não os permite a luminosidade.

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Prisioneiro X lembra Arquivo X não só pelo nome, mas pela trama fantástica e pela presença da protagonista Carmen, que poderia muito bem ser uma Dana Scully mais perigosa. O filme é basicamente construído via diálogos – muitos deles, interrogatórios. Embora possa parecer limitado, o sentimento nunca é esse. Somos tragados pela história tão logo ela engrena e ficamos juntos daqueles personagens na escuridão do bunker durante quase todo o filme. Em dado momento, quando a luz do dia finalmente aparece, somos surpreendidos pelo alívio e nos damos conta de que se passou um bom tempo sem estarmos fora daquele local. Ponto para Gaurav Seth, que habilmente constrói esse cenário claustrofóbico em seu filme.

O desempenho dos atores é formidável, com destaque para Romano Orzari como o prisioneiro futurista. Ele tem uma carga no olhar que intimida, mesmo sendo muito simpático e cordial durante boa parte da história. Michelle Nolden demora mais para se encontrar no papel, mas no terço final da trama acaba mostrando a que veio. O filme só perde pontos por incluir uma subtrama com o presidente dos Estados Unidos que parece um tanto deslocada e forçada.

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Com um bom plot twist no final e uma interessante discussão a respeito da paranoia, Prisioneiro X prova que não são necessários milhões de dólares para construir um thriller cheio de atmosfera. Basta saber o que fazer com a câmera e ter um roteiro que se preste para tal fim e podemos conferir obras ímpares como este exemplar do cinema canadense.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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