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Sinopse

Piloto veterano da Primeira Guerra Mundial é amaldiçoado e se transforma num porco antropomorfizado. Ele passa seus dias na Itália dos anos 1930 fazendo serviços esporádicos quando é contratado para resgatar uma vítima.

Crítica

O Studio Ghibli e seu mais notório fundador, o mestre da animação japonesa Hayao Miyazaki, costumam ambos ter um discurso engajado em seus filmes, como bandeiras da liberdade tanto física quanto espiritual. O cineasta consegue alcançar estes pontos sem pieguice ou sentimentalismo fácil, muito pelo contrário, despertando sensações controversas no espectador para que ele próprio chegue às suas conclusões, sejam adultos ou crianças, tratados sem condescendências e acostumados culturalmente desde cedo a se desafiar para além do mundo material. Então, um olhar para trás em sua cinegrafia não poderia ser mais apropriado em meio às tragédias ocorridas recentemente, como os ataques terroristas na França, levando centenas de vidas humanas por extremismos ideológicos que opõem Nações e etnias dentro de uma única irmandade humana.

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Um dos filmes a que mais poderia se aludir tais contradições é justamente um projeto curioso para o Ghibli e seu criador. Concebido em princípio como um curta-metragem a servir de descanso após projetos que ajudaram a fazer o nome internacional desta singular equipe de animação japonesa, Porco Rosso: O Último Herói Romântico foi dirigido por Miyazaki como um divisor de águas para sua equipe. É baseado no mangá Hikôtei Jidai, do próprio diretor, que com ele homenageava seu amor lúdico por aeronaves de guerra do início do século XX. Inúmeros fatores atípicos ocorreram nesta adaptação, como ter crescido para um longa-metragem antibelicista pela ameaça de guerras no ar, além de ser um de seus únicos filmes sem uma protagonista feminina, e também um dos mais calcados na história real, quando a maioria abstrai para mundos fantasiosos.

O personagem-título é um piloto aposentado da Primeira Guerra Mundial que, após ser amaldiçoado, passa a ostentar uma cabeça de porco, literalmente, e vira caçador de recompensas. Seu valor e bravura vão sendo testados por inúmeras provações e missões em plena Itália, onde crescia cada vez mais o fascismo a caminho de uma Segunda Grande Guerra, fazendo com que o herói necessite tomar partido contra isso.  Sem deixar de possuir pitadas de humor e fantasia como marcas registradas, aqui Miyazaki nitidamente se inspira na Hollywood clássica de filme noir, homenageando figuras míticas do gênero como a estirpe rígida de Humphrey Bogart e a empáfia irônica de James Cagney. Além disso, exímio elaborador de personagens femininas, não deixou de incluir inúmeras coadjuvantes fortes, inclusive o par romântico do protagonista como figura de ‘femme fatale’.

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Como a narrativa se passa na Itália do início do século, no Mar Adriático, as cores mais mediterrâneas deram palhetas quentes e calorosas para as cidades barrocas em meio às batalhas nos ares de tons azulados e brancas nuvens, como pinceladas de tinta em uma tela virgem. Tudo isto adensa uma história que comprovou, para toda a equipe, que se podia fazer declarações politizadas em seus filmes com repercussão mundial. Tanto que Miyazaki levou um longo tempo para filmar seu próximo projeto, arriscado e compensador, que lhe daria um novo patamar, Princesa Mononoke (1997), bem como passou a dilatar hiatos maiores entre suas obras, antes quase anuais. Filmes que merecem ser vistos e revistos se ajudarem a formar cabeças esclarecidas e não belicosas, para um mundo com menos tragédias da vida real e mais sonhos transformados em realidade, como grandes aviões a levantar voo singrando aos céus.

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é advogado e crítico de cinema, editor-chefe do Almanaque Virtual, membro da ACCRJ filiada à FIPRESCI, e professor na AIC.
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