Crítica

Incomodada por sons de sexo no quarto ao lado, a menina Joey (Olivia Cavender) levanta no meio da noite e acaba encontrando um demônio de olhos vermelhos que a leva embora. O subsequente e natural desespero da mãe é caricatural, culpa da atuação limitada de Gabrielle Stone. De qualquer forma, na companhia do namorado, a protagonista sai em busca da jovem, num corre pra lá, corre pra cá sem muito peso dramático. Palavras Diabólicas não leva mais que cinco minutos para dizer a que veio, ou melhor, para expor suas fragilidades, que não são poucas. A decupagem e a comunicação desleixada entre os planos mostram que estamos diante de um filme bem próximo do amadorismo, algo ressaltado, ainda, pelo trabalho monocórdico dos atores. São longos os 74 minutos de sua duração.

palavras-02

Anna logo vai perceber que não apenas sua filha sumiu, mas todas as crianças da pequena cidade onde vivem. Depois de um tempo, elas retornam em transe, sedentas de sangue em virtude do contato com uma entidade sobrenatural, provavelmente a mesma que sequestrou a garota no início. Palavras Diabólicas passa, a partir daí, da espera à ação, não sem repetir os mesmos erros, não sem continuar irrelevante. Como quase tudo, a aproximação dos religiosos locais é banal, destituída de ressonâncias. As mal encenadas brigas da protagonista com Dale (Mario Guzman), seu ex-marido, tampouco ajudam. Entre outras coisas, elas reforçam a falta de habilidade dos dois intérpretes. Aliás, o elenco não consegue esconder as próprias dificuldades e, assim, como efeito-colateral, não sentimos empatia pelos personagens.

Roze, diretor e roteirista, acredita que basta uma horda de crianças com camisetas brancas manchadas de sangue para o espectador ficar apreensivo. Também parece crer na eficiência de cenas enervantes (no mal sentido) como a da menina dominada que grita incessantemente. A concepção do terror é bastante problemática, tanto no que diz respeito à forma quando ao conteúdo, já que a trama aos poucos desvelada – se é que dá para dizer isso sem o mínimo de condescendência – não traz muito para que saibamos, ao menos, que tipo de demônio está promovendo aquilo e com que propósito. O que temos no mais das vezes é um corre-corre de crianças eviscerando adultos, alimentando-se de carne humana, em suma, tocando o terror em sequências iluminadas e enquadradas com negligência.

palavras-01

Não há subtextos, nem qualquer outro aspecto que sustente ou justifique Palavras Diabólicas. A realização de Roze caminha a passos largos em direção ao precipício, sem ao menos firmar-se como entretenimento. Os (d)efeitos especiais são um capítulo à parte, ou melhor, reiteram a precariedade. O fogo que consome as casas e os alvos abatidos a tiros são fruto de trucagens tão toscas quanto as reações de Gabrielle Stone e as emoções chapadas no semblante dos demais. Pensando nisso, pode-se cobrar tudo do filme, menos que seja incoerente. Ele é uniformemente estéril, um terreno infértil onde não há o que vingue. Sem gerar medo, mais próximo de constranger o espectador, é um sério candidato ao posto de pior lançamento do ano.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *