Crítica

Você tem orgulho de ser brasileiro? Se tem, a próxima pergunta seria por quê? Agora, se não tem, a curiosidade fica ainda maior. Afinal, quais são os motivos de orgulho – ou de vergonha – que a nossa nação nos oferece? Com essa questão aparentemente simples em mente o jornalista Adalberto Piotto decidiu estrear como cineasta com o documentário Orgulho de ser Brasileiro, um projeto que se por um lado causa estranheza pelo título patriota (afinal, não há ponto de interrogação), por outro vai além da mera percepção inicial, buscando proporcionar uma visão muito ampla dos méritos e das mazelas do nosso país.

Obviamente realizado por e para brasileiros, o longa se apresenta de forma bastante tradicional, através de depoimentos de cerca de duas dezenas de personalidades, das mais diversas áreas da sociedade, alternando profissões, históricos e interesses. O painel é vasto, apesar de não ser completo. Mas isso, por outro lado, talvez fosse exigir demais. Por exemplo, um dos entrevistados é o ex-presidente da república Fernando Henrique Cardoso. Certamente alguns sentirão falta de outro ex-presidente recente, Luís Inácio Lula da Silva, para servir de contraponto. Piotto se defende deste tipo de acusação avisando que 30 personalidades foram contatadas, e destas apenas 16 concordaram em aparecer no filme. Entre as que recusaram estava Lula.

Isso abre espaço para diversas reflexões. Por um lado, sendo uma obra audiovisual independente, qual o compromisso que o realizador teria em dar voz a todos os lados possíveis? Talvez ele tivesse uma opinião própria a respeito da questão levantada e buscasse apenas aqueles depoimentos que a corroborassem. Mesmo assim o diretor tentou ser justo, abrindo espaço às mais diversas e contrárias opiniões. Bom, se essa era a vontade, ao se deparar com uma recusa, não deveria ele ir atrás de um outro alguém de peso e relevância similar?

Mas Orgulho de ser Brasileiro não se prende apenas nisso. Há essa visão macro da sociedade, mas há também aqueles que falam de suas próprias experiências e histórias. Gerald Thomas mora em Nova York, mas possui muita propriedade para refletir sobre os problemas nacionais. Talvez um morador de rua ou um catador de papéis compartilhasse das mesmas posições do renomado diretor de teatro. Mas teriam estas vozes a mesma ressonância que a do intelectual possui? Não que o filme seja elitista ou esnobe – muito pelo contrário. Mas ao colocar lado a lado nomes como o técnico de futebol Carlos Alberto Parreira, os ex-ministros Adib Jatene e Marina Silva, os músicos e irmãos Max de Castro e Simoninha, o artista plástico Romero Britto, a geneticista Mayana Zatz, o filósofo e professor da Unicamp Roberto Romano, a empresaria Yara Gouveia e o escritor Ferréz, dentre outros, o leque se abre, seu volume ganha outra dimensão e aquilo que muitas vezes pensamos, mas não chegamos a refletir a respeito, encontra novo significado.

Há alguns poréns envolvendo a realização de Orgulho de ser Brasileiro. Talvez o mais evidente seja sua rápida produção – o longa inteiro foi realizado em menos de 10 meses – que impediu uma maturação maior sobre qual foco o tema deveria, de fato, abordar, gerando um trabalho amplo, porém de profundidade relativa. Entre os entrevistados, alguns se repetem em discursos, enquanto que poucos acabam sendo explorados em demasia justamente por serem as posições dissonantes. Ou a presença em excesso do realizador em cena, que às vezes termina por roubar a atenção do próprio convidado. Estes, no entanto, são pormenores de uma obra maior, que consegue ir além do mero ufanismo propondo um debate tão justo quanto obrigatório: afinal, se o país é um reflexo do seu povo, como fazer para o nosso Brasil nos dê, hoje e amanhã, cada vez mais motivos de orgulho?

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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