Crítica

Pequena produção australiana, O Sonho de Greta não é o primeiro e nem será o último filme a integrar a 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo que se inspira em ou emula outras produções mais familiares ao grande público. Aconteceu com Aloys (2016), que busca um alinhamento com os filmes de Spike Jonze e Charlie Kauffman, e se repete agora com o longa de Rosemary Myers, que remonta à estética comum aos cineastas Wes Anderson e Jared Hess. Se Anderson é um cineasta de grandíssima qualidade, Hess é certamente deles o que mais falha. E Myers parece abraçar os erros do segundo diretor.

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Retratando a conturbada adolescência da protagonista, durante a passagem de seus 15 anos, Myers desenvolve seu filme no universo estudantil contaminado por hierarquias, clichê explorado em demasia pelos norte-americanos juntamente da temática do bullying. Infelizmente, entre tantas alegorias e uma direção de arte belíssima, assistimos a uma produção que desanda para momentos sem graça, com um ritmo de piadas forçado e que busca a cada cena emular algo, sem, por exemplo, a delicadeza com a qual Wes Anderson trata o âmbito familiar e o adolescer. Se o erro aqui fosse apenas a velocidade acelerada da trama, afinal o filme dura contidos 70 minutos, Myers até poderia justificar o desenvolvimento superficial da história. Mas o problema é muito mais a incapacidade de entregar algo que trate sua temática com maior seriedade, menos escracho e piadinhas infames. Sua decupagem de planos e enquadramentos é outro aspecto preguiçoso. São travellings, câmeras estáticas e algumas composições primárias.

Entrando numa subtrama surrealista e onírica, que flerta com o cinema fantástico e de horror, com potencial para apresentar uma maior complexidade da personagem-título, O Sonho de Greta falha incansavelmente no que se propõe, ou seja, na mostra das dificuldades de manter a essência juvenil frente à necessidade de amadurecer, às imposições familiares e sociais. Essa pressão vai se diluindo, o que torna a história enfadonha. Ao menos assistimos a um filme plasticamente belo, mas longe de ser inspirador e emocionante. Também vale lembrar a criação do forçado interesse romântico entre Greta (Bethany Whitmore) e o falante Elliot (Harrison Feldman), que deveria ser cômico, mas que se torna aos poucos irritante e infantil. Ele leva tudo ao pé da letra, ela está querendo fugir da realidade que se apresenta.

Com uma premissa interessante e um potencial grandioso, tanto para desenvolver-se nos padrões de fábulas quanto para subvertê-los dentro das inspirações citadas anteriormente, temos, contudo, um filme limitado. Mesmo com uma de suas cenas, próximo ao final, sendo tão emblemática, a na qual Greta e Elliot trocam de roupas, assim pincelando algo relativo às questões de gênero, o filme de Myers é uma daquelas balas que se vendem agridoces, para descobrirmos tardiamente que são de arripunar frente à tamanha doçura exagerada que possuem.

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é graduado em Cinema e Animação pela Universidade Federal de Pelotas (RS) e mestrando em Estudos de Arte pela Universidade do Porto, em Portugal.
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