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Sinopse

Aposentado do cargo de oficial de justiça, Benjamin Espósito se dispõe a escrever um livro que relata uma história trágica da qual foi testemunha. Uma mulher foi estuprada e assassinada e ele vai revolver esse vulto do passado.

Crítica

Vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2010 e novamente com seu ator preferido à frente do elenco, Ricardo Darín, Juan José Campanella assina O Segredo dos seus Olhos e preenche seu trabalho com personagens falhos, engraçados, estúpidos, dramáticos. Ou seja, pessoas que poderiam estar ao seu lado neste momento. Esta proximidade de seus personagens com o mundo real é uma marca do diretor, que acerta novamente em uma trama recheada de suspense, com ótimos momentos de humor e uma grande levada dramática. Misturar tudo isso poderia ser difícil, mas não para o cineasta argentino.

Darín vive o funcionário público aposentado Benjamin Esposito, um homem que chega a um ponto na vida onde precisa escolher se dedicar a um hobby ou ficar parado, sem nada a fazer. Com uma idéia fixa na cabeça, sobre um caso que ajudou a resolver há 30 anos, Esposito decide escrever um romance a respeito da investigação. A ideia parece boa o suficiente para ser compartilhada com Irene (Soledad Villamil), sua antiga colega de trabalho e paixão platônica desde aquela época. Desencavando um passado adormecido, Esposito relembra o caso de uma moça estuprada e morta e os desenrolamentos da investigação que levaram ele e seu amigo Sandoval (Guillermo Francella) a uma rota de colisão com um perigoso assassino.

Como em O Mesmo Amor, a Mesma Chuva (1999), O Filho da Noiva (2001) e Clube da Lua (2004), Ricardo Darín foi convocado por Juan José Campanella para dar um toque de “homem comum” a este obcecado e imperfeito ser humano chamado Benjamin Esposito. Apaixonado por sua chefe, mas nunca com coragem o suficiente para dizê-lo, Benjamin é uma pessoa resignada com seu eterno status de coadjuvante. Em sua cabeça, nunca conseguiria conquistá-la. Esta certeza o acaba deixando amargo, fato que ele sempre esconde com ironias. Seu melhor amigo, Sandoval, um homem com sérios problemas com a bebida, é um dos poucos que realmente entende a cabeça de Benjamin. É Sandoval, do alto do seu jeito amalucado de ser, quem ajuda o obstinado Espósito a investigar o caso de uma bela moça morta por um estuprador foragido.

Alfred Hitchcock é certamente uma referência que se pode citar ao comentar O Segredo dos seus Olhos. O diretor britânico era hábil em misturar suspense e drama com doses generosas de humor em seus trabalhos. Campanella parece saber seguir muito bem o mestre, montando uma trama nada previsível, envolvente ao extremo e que consegue deixar o espectador tenso sempre que necessário. Os momentos de comédia são muito inspirados e nunca soam como alívios cômicos artificiais. Tudo é bastante orgânico no roteiro do longa-metragem, assinado pelo próprio diretor, baseado no livro de Eduardo Sacheri.

Quem já assistiu aos demais filmes de Campanella deve lembrar que a composição dos planos do cineasta é sempre muito bem bolada. A mise-en-scène é ponto crucial para o diretor, que prefere soluções nada óbvias para enquadrar seus atores. Cada plano parece uma pintura bem pensada – e o fato de os primeiros momentos do filme remeterem às artes plásticas certamente não é gratuito. Em uma cena mais adiante, vemos Darín em um canto da tela, enquanto a câmera está bastante afastada, espiando o personagem tentar escrever seu romance. O quadro acaba destacando objetos da sala que, aparentemente, não são importantes, mas que servem para compor aquele frame. O jogo de claro e escuro nos momentos mais sombrios da trama também agrega ao resultado final, contrastando com os tons mais fortes e coloridos do restante do filme.

Com uma ótima edição, visitando o passado e presente dos personagens, O Segredo dos seus Olhos é um belo exemplar do cinema argentino e mais um ótimo trabalho no currículo do diretor Juan José Campanella. Trabalho esse que levou tudo a que foi indicado na premiação do jornal argentino Clarín (9 prêmios ao todo), venceu duas importantes categorias no Goya 2010 (o Oscar do cinema espanhol) e, como dito, levou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.

O longa-metragem só não ganha nota máxima por se estender demais. Fechados os primeiros 80 minutos de projeção e já tínhamos um filmaço de suspense nas mãos. No entanto, Campanella se viu na obrigação de ir além do simples jogo de gato e rato – e está certíssimo nisso. Mas para chegar neste saudável desenrolar dos fatos depois de toda a investigação, foram necessárias muitas voltas até se chegar ao que interessava. Felizmente, o final, surpreendente, tira o amargo da boca daqueles 15 minutos à deriva.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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