Crítica

Não há construção de sociedades sólidas sem comprometimento com os meios educacionais. Nas salas de aula, sobretudo nas de formação básica, molda-se o futuro cidadão, para o bem ou para o mal. Nesse contexto, a figura do professor é muito importante, afinal por ela passa o direcionamento não só intelectual, mas também moral, dos avessos a deveres e ditados de ocasião. São inúmeros os filmes que centralizam o educador, lançando luz sobre seu valor. Some a esse filão o recente O Que Traz Boas Novas, longa canadense que concorreu ao Oscar 2012 de Filme em Língua Estrangeira.

Estamos em Quebec, logo após o suicídio por enforcamento da professora encontrada suspensa em plena sala de aula. Comoção geral: pais atentos ao trauma dos filhos, crianças estarrecidas e a diretiva ocupada com o restante do ano letivo. Cabe ao Sr. Bachir Lazhar, imigrante argelino, a missão de substituir na prática e no campo psicológico aquela que, involuntariamente, fez da morte uma dura lição aos pequenos. Para ele e para todos os demais o início é trôpego, e como, oras, poderia ser diferente? Os alunos estão arredios, estranhos aos métodos na certa “ultrapassados” de alguém que cita Balzac na contramão da conduta professoral contemporânea. O novo mestre sente o golpe e precisará administrá-lo enquanto vê seu passado bater à porta.

Ainda que se possa extrair de O Que Traz Boas Novas observações acerca da coletividade, nenhuma delas realmente ganha fôlego norteador. Do que trata o filme? A rigor, da jornada particular de um homem, para além de qualquer matiz enriquecedor. O acúmulo de mensagens ligeiras (imigração, morte, aprendizado moderno, etc) acaba tirando do filme possibilidades de expansão. Então, o maior pecado de O Que Traz Boas Novas é ater-se puramente à trama, sem incentivar subtextos ao protagonismo. Dessa maneira, navegamos em maré mansa, na qual seguimos tranqüilos, sem ondas ou virações maiores.

Contudo, seria injusto negar que o filme possui olhar maduro, preocupado com questões de ordem educacional e humana. Assim, bem-intencionado, o diretor escorrega mesmo na submissão à exposição, atendo-se pouco à conexão entre a instabilidade interna do mestre (atormentado pela dura situação social de seu país) e as particularidades diárias que fazem do âmbito escolar um dos mais relevantes. Sem esses cuidados de carpintaria, o longa de Philippe Falardeau acaba como trajetória (anêmica) pessoal e bonita homenagem à relação aluno/professor, aliás, de cerne semelhante a outras vistas por aí.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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