Crítica

Mesmo o homem que é puro de coração e faz suas preces à noite, irá se transformar num lobo quando o mata-lobos florescer e a lua de outono brilhar.” O trecho do suposto poema é repetido exaustivamente durante a projeção de O Lobisomem, clássico de 1941 dirigido por  George Waggner e que pode ser encontrado em home video na coleção de Monstros da Universal. Curiosamente, esta mesma frase traduz todo o espírito do filme que, ao contrário dos outros títulos feitos na mesma época pelo estúdio, está muito menos focado no terror visual e bem mais acentuado no horror psicológico, tornando esta uma das mais interessantes produções do gênero.

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A história segue os moldes clássicos: o jovem Larry Talbot (Lon Chaney Jr.) retorna ao castelo do pai (Claude Rains) no País de Gales após a morte do irmão mais velho. Ele conhece e se apaixona por Gwen (Evelyn Ankers), filha do dono de uma loja. Mesmo comprometida com Frank (Patric Knowles), um aspirante a caçador, ela sai com o outro rapaz, acompanhada de uma amiga, que é atacada por uma criatura (ponta de Bela Lugosi). Larry tenta salvar a moça, mas é mordido pelo lobo, logo se tornando um deles. Ou seja, perigo para todos à volta.

A trama segue muito mais a linha Dr. Jekyll e Mr. Hyde, focando nos traumas passados de Larry, suas inseguranças e como elas saltam para fora de seu corpo quando transformado no animal sanguinário. Em vez do espectador ter medo dele, o que se sente é pura pena por sua condição, já que ele claramente sofre por ter sido amaldiçoado com um dom tão violento. Não apenas o protagonista é complexo, como também os outros personagens e a própria atmosfera da história, que acaba ficando mais soturna e, porque não, crível ao longo dos minutos. O roteirista Curt Siodmak utiliza o plot clássico de forma extremamente original, criando um mundo onde lobisomens são apenas folclore para a maioria, mas à medida que se mostram reais, mudam completamente a sociedade onde estão inseridos. As curiosidades científicas ajudam bastante neste conceito daquele nicho inserido na tela. Para a maioria, os lobisomens estão contaminados com licantropia, doença na qual os seres humanos imaginam que são homens-lobos. Assim, as vítimas adquirem as características físicas do animal.

Apesar da boa história, o longa é extremamente datado por conta de seus efeitos visuais e da maquiagem utilizada. O lobisomem de Larry causa qualquer reação, menos medo, assim como o “horror” das imagens, especialmente quando o pentagrama aparece em cena como um “sentido de Aranha”. Para a época podia ser o auge dos efeitos especiais, mas hoje em dia ficaria completamente ridículo não se soubesse a data em que o filme foi produzido. Por outro lado, a fotografia é extremamente competente ao saber utilizar o contraste dos cenários sombrios com o terror devido, assim como a introdução das balas de prata surgem como um grande avanço (e solução) da história - trágico clímax, por sinal.

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Apesar de não parecer atemporal por conta do visual, O Lobisomem pode ser encarado como um belo drama psicológico em que o horror importa menos que o desenvolvimento de seus personagens e sua rica trama. O filme fez tanto sucesso na época que alavancou novamente as produções do gênero e, claro, permitiu que vários remakes ou novas histórias protagonizadas por lobisomens fossem produzidas. Este clássico da Universal serve para mostrar que boas imagens podem ajudar na ascensão de um filme, mas sem uma boa história, não servem para nada. Ainda bem que, aqui, o caso continua sendo extremamente positivo e prazeroso de assistir.

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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