Crítica

My Life Directed by Nicolas Winding Refn lembra em alguns aspectos O Apocalipse de um Cineasta (1991). Ambos são documentários intimistas, que trazem diretores sendo filmados por suas esposas durante a produção de um novo filme, captando os bastidores das obras. Mas se Eleanor Coppola conseguiu pegar seu marido Francis Ford Coppola em meio à pressão e ao caos no qual ele se meteu durante as conturbadas gravações de Apocalypse Now (1979), gerando uma obra complexa e vista como um dos melhores documentários sobre bastidores de produções cinematográficas, Liv Corfixen não arranja o mesmo tipo de material ao filmar Nicolas Winding Refn, obtendo como resultado um filme que não chega a ser tão interessante.

Corfixen não filma seu marido no meio de um Apocalypse Now, mas sim na produção de algo bem mais modesto: o belo e violento Apenas Deus Perdoa (2013), seu primeiro trabalho após o grande sucesso alcançado pelo excepcional Drive (2011) e, claro, segunda parceria com o ator Ryan Gosling. A partir disso, ela foca desde o fim da pré-produção do longa, passando pelas gravações e chegando finalmente ao lançamento e recepção no Festival de Cannes de 2013. No processo, a diretora capta a pressão que o marido sente por querer fazer um filme tão bom quanto seu anterior, e que ao mesmo tempo não pareça que está se repetindo.

My Life Directed by Nicolas Winding Refn tem pouco menos de uma hora de duração, e só por isso é possível prever que Liv Corfixen não conseguiu material o suficiente para realizar um longa aprofundado. Assistindo ao filme isso fica evidente, e talvez seja consequência do fato de Refn se sentir um tanto incomodado com a presença da câmera da esposa, não a deixando penetrar muito em seu processo criativo (“Você não me deixa filmar nenhuma de suas crises”, ela diz para ele em determinado momento). Assim, as coisas que Corfixen consegue mostrar não deixam de soar um tanto superficiais e até comuns, sendo que o método de trabalho de seu marido também não tem nada de muito peculiar. E apesar do estresse de seu realizador, as filmagens de Apenas Deus Perdoa revelam-se bastante tranquilas, algo que, inclusive, é completamente oposto à sua narrativa. Ou seja, o documentário não tem nada de revelador com relação ao filme, e o que vemos aqui sobre ele não é muito diferente do que aparece nos costumeiros making ofs, podendo ter sido montado de forma a ser colocado nos extras dos DVDs e blu-rays do longa.

No entanto, isso não impede o documentário de ter detalhes curiosos que o ajudam a ser, no mínimo, cativante. É bacana ver, por exemplo, o grande companheirismo existente entre Nicolas Winding Refn e Ryan Gosling, com o ator não só como um ótimo parceiro de trabalho (além de produtor, ele foi diretor de segunda unidade em Apenas Deus Perdoa), mas também uma espécie de membro da família, e os momentos nos quais brinca com as filhas do cineasta são genuinamente graciosos. Além disso, Liv Corfixen mostra que seu marido não é um diretor que pensa que tudo que filma é ouro, como alguns de seus colegas de profissão (sim, estou olhando para você, M. Night Shyamalan). Boa parte de seu constante estresse, na verdade, vem do fato dele se cobrar muito, e não à toa as críticas para as quais ele dá mais atenção no final das contas são as negativas, já que são as que podem ressaltar detalhes sobre seu trabalho que ele pode tentar melhorar em projetos futuros.

Uma pena que isso não seja o bastante para tornar My Life Directed by Nicolas Winding Refn um documentário particularmente essencial como outros do tipo. É um filme que não traz grandes insights sobre bastidores, servindo mais como uma pequena curiosidade sobre um diretor talentoso.

 

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é crítico de cinema, formado em Produção Audiovisual na ULBRA, membro da SBBC (Sociedade Brasileira de Blogueiros Cinéfilos) e editor do blog Brazilian Movie Guy (www.brazilianmovieguy.blogspot.com.br). Cinema, livros, quadrinhos e séries tomam boa parte da sua rotina.
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