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Sinopse

Katniss Everdeen está retornando a salvo depois de ter ganho o 74ª Jogos Vorazes, juntamente com o colega Peeta Mellark. Vencer significa que devem retornar e abandonar sua família e amigos próximos, embarcando na “Turnê da Vitória” pelos distritos. Em decorrer do percurso, Katniss sente que uma rebelião está em ebulição, mas o congresso continua fortemente no controle, ao mesmo tempo em que o Presidente Snow prepara o 75º Jogos Vorazes (Massacre Quaternário), uma competição que pode mudar Panem para sempre.

Crítica

Muitos tentaram, porém poucos são os que conseguem. Após o impressionante sucesso da adaptação cinematográfica do mundo mágico de O Senhor dos Anéis e da igualmente bem sucedida série Harry Potter, inúmeros foram os títulos que tentaram reproduzir o mesmo impacto junto ao público e com a crítica, porém sem sequer chegar aos pés destes exemplos aqui citados. O que provavelmente mais se aproximou foi a Saga Crepúsculo, que ao menos teve um bom retorno nas bilheterias – a despeito de qualquer avaliação mais detalhada revelar suas inúmeras falhas e fragilidades enquanto obra. Por isso é bom estar atento para o desenrolar desse novo universo proposto nos livros Jogos Vorazes. E isso porque após um início complicado (o primeiro filme, Jogos Vorazes, é de 2012), que dividiu a opinião da crítica (67% de avaliação positiva no MetaCritic) e faturou alto em todo o mundo (arrecadação global de quase US$ 700 milhões), esse Jogos Vorazes: Em Chamas, segundo capítulo de uma quadrilogia, felizmente representa um passo adiante numa trama que parece ter mais a oferecer do se poderia imaginar à princípio.

O futuro desenhado pela escritora Suzanne Collins é deprimente. Os Estados Unidos estão divididos em distritos, e cada um é progressivamente melhor estabelecido do que o outro. Atualmente existem doze deles, após o décimo terceiro ter sido dizimado para evitar uma possível revolução. Os Jogos Vorazes são uma espécie de megaespetáculo midiático, um reality show violento onde dois jovens de cada região são selecionados por sorteio para lutarem até à morte com os demais escolhidos. Ao vencedor, fama, glória e fortuna. Aos demais, a eliminação. O objetivo deste artifício é oferecer uma ponta de esperança a todos os descontentes, mantendo um sistema desigual, injusto e corrupto. Porém, no final da 74° edição do torneio, um casal permaneceu vivo – ao contrário de todas as disputas anteriores: Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) e Peeta Mellark (Josh Hutcherson). O Presidente Snow (Donald Sutherland) permitiu que os dois sobrevivessem graças a um golpe publicitário: como fingiram estarem apaixonados, os representantes do 12° Distrito puderam ser considerados, ambos, vitoriosos. Afinal, eram a “cara” dos Jogos Vorazes.

A história de Em Chamas começa logo após a conclusão do longa anterior. Katniss e Peeta são estrelas populares. Mas, ao contrário do que o sistema pretendia, eles acabam incitando um sentimento de mudança muito maior do que o planejado. Com isso, temem-se novas revoltas, e a solução é fazer com que nossa heroína seja desacreditada ou, num pior cenário, simplesmente morta. Para isso é convocado um novo tipo de duelo, chamado de Massacre Quaternário, que deve acontecer a cada vinte e cinco anos, reunindo campeões do último quarto de século. Engana-se, no entanto, quem pensar que estaríamos diante de um repeteco de tudo que foi visto antes, com os heróis novamente lutando por suas vidas. Isso, de fato, acontece. Porém as escalas envolvidas são maiores, e pela primeira vez temos a sensação de um desenrolar de ações mais amplas, uma verdadeira rede de intrigas contra os líderes oficiais.

É justamente neste ponto em que Em Chamas se revela muito superior à Jogos Vorazes. A violência está novamente presente, porém de modo mais subliminar e inserido em um contexto pertinente. Se no primeiro filme tínhamos crianças e adolescentes matando uns aos outros indiscriminadamente, sem a reflexão necessária para que tais atos fossem percebidos e discernidos por sua audiência principal – mais ou menos da mesma idade dos personagens em cena – dessa vez há uma conspiração cheia de ramificações, com efeitos e consequências. Tudo faz parte de um plano, ainda que o mesmo não seja revelado à contento. Mas o importante é que há, portanto, algo a ser contado, que finalmente atrai o espectador para o centro do enredo, mostrando que a troca de diretores (ao invés de Gary Ross, do melodramático Seabiscuit, 2003, temos dessa vez Francis Lawrence, do apocalíptico Eu Sou a Lenda, 2007) foi, à despeito das desconfianças, benéfica.

Se o vislumbre de uma luz no fim do túnel se revela para os envolvidos em ambos os lados da tela, muito se dá também pelo ótimo desempenho do elenco, com destaque para a oscarizada Lawrence, que demonstra garra e segurança à medida do esperado. O novato Sam Claflin, como o aliado Finnick, se revela um bom adendo, enquanto seguimos lamentando o pouco tempo em cena de Liam Hemsworth (algo que que deve ser compensado nas duas próximas sequências), pois é o único que possui química suficiente para fazer par com a protagonista. Woody Harrelson, Elizabeth Banks e Lenny Kravitz possuem menos à fazer do que em suas incursões anteriores, enquanto que Philip Seymor Hoffman é um acréscimo importante, porém que deverá ser melhor explorado também no futuro (e que terá pela frente uma poderosa Julianne Moore, como já anunciado). Por fim, é importante o registro da participação de Josh Hutcherson, que oferece um contraponto interessante à selvageria reinante, pois sua força está bem equilibrada com um senso de delicadeza e perspicácia mais do que necessária.

Jogos Vorazes: Em Chamas teve um orçamento de quase o dobro do primeiro filme (US$ 140 milhões), e chegou aos cinemas brasileiros uma semana antes do seu lançamento no resto do mundo. O retorno financeiro deve ser à altura do investimento, e é muito possível que venha a se posicionar ao lado das mais bem sucedidas aventuras literárias já adaptadas para a tela grande. No entanto, o final em aberto, o início abrupto – se você não viu ou leu Jogos Vorazes, é preciso uma recapitulação antes – e a crítica um tanto desajeitada em relação à sociedade moderna ainda prejudicam uma apreciação mais positiva. Melhorou, mas ainda há um bom caminho neste sentido a ser trilhado.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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