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Sinopse

João Carlos Martins foi considerado um prodígio do piano e conquistou fama internacional. Ele tenta a carreira política, mas tem problemas ao ser acusado de fraude. Ele retorna à vida de pianista, mesmo quando um problema médico retira parte de seus movimentos. Usando apenas uma das mãos, o músico realiza concertos e depois torna-se maestro.

Crítica

Há um ruído considerável entre a intenção primordial de João: O Maestro e o modo de tentar alcança-la. Levando em consideração o tom e o aspecto dramatúrgico, o filme fala mais a respeito da obsessão do musicista João Carlos Martins. Contudo, o roteiro escrito pelo também diretor Mauro Lima, ao invés de se debruçar sobre instantes de imposição desse traço da personalidade do biografado, prefere um caminho mais ordinário, partindo linearmente da infância marcada pela hostilidade no ambiente escolar e do empenho do pai no sentido de robustecer a sua educação. Aliás, essa fase, que ganha atenção desproporcional, ocasionalmente entrecorta momentos capitais da vida adulta do protagonista, supostamente se prestando a estabelecer uma conexão fundamental entre passado e presente. Acompanhamos os primeiros passos de um pianista virtuoso que logo supera a mestra e é repassado, na condição de pupilo, aos cuidados do rigoroso, porém acolhedor, José Kliass (Caco Ciocler).

O esmero da produção é visível em João: O Maestro. Da fotografia à direção de arte, tudo transpira um bom gosto evidente. Todavia, essa plasticidade conveniente e bem construída está a serviço de uma trama destituída de paixão, exatamente um dos elementos imprescindíveis à compreensão da amplitude dos esforços de João. O protagonista é interpretado na maior parte do tempo por Rodrigo Pandolfo. A experiência pregressa do ator com o instrumento musical é vital à verossimilhança das cenas ao piano. Ele, igualmente, consegue transmitir a visceralidade de João ao executar curvado, especialmente as partituras de Johann Sebastian Bach, assim destoando completamente da postura ereta que caracteriza os seus colegas. Não há tempo à maturação dos componentes e episódios que poderiam substanciar emocionalmente essa trajetória repleta de revezes e reviravoltas. Somos conduzidos apressadamente pelas circunstâncias que fizeram do menino uma sumidade.

João: O Maestro sofre de uma frieza contraproducente, fruto, sobretudo, da maneira como Mauro Lima aborda situações complexas. A sucessão de dificuldades enfrentadas, seja por conta de acidentes ou efeitos colaterais decorrentes da atividade incessante, configura um acúmulo anódino, que não fomenta percursos pungentes. A vida pessoal de João Carlos Martins é retratada com semelhante falta de vigor. Ao priorizar a quantidade de informações em detrimento da força dramática que algumas delas porventura poderiam ter, o longa padece. A transição para a maturidade, quando João passa a ser vivido por Alexandre Nero, conserva esse itinerário fundamentado na superficialidade, estranhamente evitando aprofundar-se em qualquer meandro. Os desperdícios se avolumam até provocar um sufocamento narrativo praticamente irreversível. Mesmo a obstinação de João diminui enquanto motriz, pois se confunde, sobremaneira, com teimosia, então sua siamesa prosaica.

O cineasta se revela bastante afoito ao desenhar cinematograficamente João Carlos Martins. Um dos grandes problemas de João: O Maestro é realmente a ausência de recorte, a subordinação a uma estrutura falsamente engenhosa – pois os excertos de meninice que ressurgem, volta e meia, não possuem efeito considerável –, mas refém da banalidade. O filme é uma coletânea de lampejos das fases do protagonista. Inexiste algo que sirva para alinhavar as mais diferentes ocorrências. A obsessão deveria desempenhar tal função de argamassa. Entretanto, ao realizador parece mais importante a abrangência, nem que para isso seja preciso penhorar a organicidade das experiências de João, tratando quase tudo com um viés melodramático próximo ao das telenovelas, sem explorar devidamente as possibilidades oferecidas por uma realidade cheia de paixões avassaladoras e das dores delas derivadas. Uma carreira dessas, sublinhada tanto por êxitos quanto por várias quedas, merecia mais pulsação.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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