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Sinopse

Um surto viral deixa a Coréia do Sul em estado de alerta máximo. Logo, o governo decreta lei marcial, especialmente por conta da velocidade com que a praga se alastra, criando hordas de zumbis. Os passageiros de um trem com destino a Busan vão ter de lutar com unhas e dentes pela própria sobrevivência.

Crítica

Invasão Zumbi é um típico exemplar do cinema sul-coreano que, tendo emergido na década passada, ganhou espaço em festivais internacionais e passou a ser conhecido e consumido no Ocidente – com Park Chan-wook e Bong Joon-ho como seus principais nomes. E é sobretudo de Joon-ho que o diretor Yeon Sang-ho se aproxima nesse seu primeiro longa-metragem live action, após algumas animações – sendo a mais recente delas, Seoul Station (2016), também sobre uma epidemia zumbi. Além de toda a tradição ocidental desse subgênero, uma importante referência para Sang-ho parece ser O Hospedeiro (2007), excelente filme de monstro dirigido por Joon-ho.

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Como outro exemplar coreano aqui citado, Invasão Zumbi conta uma história fantástica sobre um ataque de criaturas saídas diretamente de produções B do cinema de horror e que tenderia, por isso, a priorizar os grandes momentos de ação da narrativa. Ambos os filmes entregam o que se espera nesse sentido, com Joon-ho e Sang-ho dirigindo com imensa competência as cenas em que seus respectivos protagonistas tentam desesperadamente escapar de uma ameaça apavorante – um peixe mutante gigante no caso anterior, os mortos-vivos neste de agora. Há, inclusive, uma cena aqui com um grupo de personagens correndo em primeiro plano sendo seguidos por uma horda de zumbis ao fundo, que parece remeter à sequência do primeiro ataque do monstro em O Hospedeiro.

Mas é no trato com os personagens e na aposta no elemento emocional que mora a força desses dois filmes. No caso de Invasão Zumbi, Sang-ho usa a situação de uma epidemia fora de controle para, confinando um grupo de pessoas num trem (espaço, aliás, que foi cenário de Expresso do Amanhã, de 2013, do próprio Joon-ho), discutir aspectos do comportamento humano quando a capa de civilização é arrancada – nesse sentido, lembra um pouco O Nevoeiro (2007), de Frank Darabont – e, ao mesmo tempo, acompanhar a evolução moral de seu protagonista, pai ausente e profissional ganancioso que é forçado a garantir a sobrevivência da filha pequena em meio ao caos e a desenvolver empatia por gente que ele normalmente desprezaria.

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Soa óbvio, talvez piegas, mas o diretor lança mão com precisão da dramaturgia desavergonhada do cinema sul-coreano, que não costuma evitar a tentação do melodrama. Os personagens de Invasão Zumbi gritam, choram, expressam seus sentimentos sem meios termos, enquanto a música sobe e a câmera de Sang-ho se aproxima de seus rostos nos momentos emocionalmente mais fortes. Isso pode incomodar aqui e ali, na construção meio caricata da figura de um vilão engravatado e egoísta, por exemplo, e afetar sensibilidades ocidentais mais adeptas de uma economia dramática que não interessa a esse tipo de cinema.

Mas trata-se, no fim das contas, de habituar-se aos filmes fantásticos feitos na Coréia do Sul, à entrega visceral às emoções que ele propõem, e de entender que os caminhos da boa dramaturgia não são unívocos e que o apelo melodramático pode também, como fez inúmeras vezes na história do cinema (inclusive ocidental), gerar grandes obras. Além disso, mesmo nesses pequenos incômodos presentes em Invasão Zumbi, cabe pensar até que ponto eles não estão dialogando, brincando, com a tradição do subgênero em que o filme se encaixa. Basta lembrar do subtexto sócio-político do cinema de George Romero, que em Terra dos Mortos (2005), por exemplo, recorria à noção de luta de classes e encarnava a vilania absoluta num personagem semelhante ao vilão de Sang-ho, homem poderoso e inescrupuloso (interpretado por Dennis Hopper).

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Esses diálogos com a tradição, aliás, estão bastante presentes, desde a caracterização dos zumbis como seres velozes, enraivecidos e alucinados, que remete a Extermínio (2002), passando por algumas imagens que fazem lembrar o quanto Guerra Mundial Z (2013) poderia ter sido, com um pouco menos de pressa, ótimo, até a cena final, que, claro, brinca com a ironia da conclusão de A Noite dos Mortos-Vivos (1968). Aqui, no entanto, a referência não se completa, por uma escolha de Sang-ho que parece acertada: não há em Invasão Zumbi a carga de acidez política do clássico maior de Romero, e emular seu final representaria uma ruptura com o tom adotado no restante do filme. Daí fazer tanto sentido a entrada em cena de um quase deus ex-machina (musical), para resolver os problemas de personagens pelos quais o espectador aprendeu a torcer, em meio a choros, gritos e perdas, ao longo de duas horas.

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é um historiador que fez do cinema seu maior prazer, estudando temas ligados à Sétima Arte na graduação, no mestrado e no doutorado. Brinca de escrever sobre filmes na internet desde 2003, mantendo seu atual blog, o Crônicas Cinéfilas, desde 2008. Reza, todos os dias, para seus dois deuses: Billy Wilder e Alfred Hitchcock.
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