Homem Comum
Crítica
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Sinopse
Por 20 anos, Carlos Nader acompanhou a rotina do caminhoneiro Nilson, com uma simples pergunta: qual o sentido da vida? Desde então registrou e fez parte dos infortúnios e reviravoltas do dia a dia daquele que acabou se tornando seu amigo.
Crítica
"Será que ele é o louco mesmo ou será que ele é o certo?" diz o caminhoneiro Nilson, que protagoniza Homem Comum, ao assistir a um trecho de A Palavra (1955), de Carl T. Dreyer, em que o personagem Johannes aparece. Considerada uma obra-prima do cinema dinamarquês, este longa trata de questões existenciais que envolvem fé, família e o absurdo. E no filme de Carlos Nader, essa tríade é repetida constantemente ao tratar da história de um personagem que nada de extraordinário traz. Apenas as suas vivências ordinárias, que estão presentes na vida de qualquer pessoa. Essas experiências de Nelson foram acompanhadas por Nader por mais de 20 anos e resultaram neste documentário vencedor do prêmio máximo no Festival É Tudo Verdade, em 2014.
Como bem coloca o diretor, A Palavra e Homem Comum possuem bem mais que imagens esteticamente similares, mas também uma abordagem existencial. A ideia para a realização surgiu em outro projeto. Nader entrevistara caminhoneiros perguntando a eles coisas banais para depois investir na questão principal: “A vida às vezes não parece um tanto absurda, como um sonho?”. Numa dessas entrevistas, acabou conhecendo Nilson, caminhoneiro casado e pai de uma garota. Ao longo dos anos, acompanhamos os acontecimentos mais diversos na vida dele. São episódios que vão desde rotinas de trabalho, viagens e até as doenças e mortes que o rodeiam.
Em todos esses momentos, o diretor intercala o homem real com o ficcional. A utilização de cenas de A Palavra nos coloca frente a questão de até onde a arte imita a vida, ou o contrário. Nader poderia ser muito bem Johannes do filme de Dreyer. Um homem que parece cego pela sua busca pela fé e existencialismo. É importante esclarecer como o cineasta se faz presente e é personagem da história. Em determinado momento, ele ainda dá a entender que não é um filme apenas seu, mas, sim, uma realização quase que conjunta com o próprio Nilson.
Vencedor de três prêmios de melhor documentário no Festival é Tudo Verdade, o último ganho em 2015 (um ano após Homem Comum), Carlos Nader é um dos grandes documentaristas do país. A influência de Eduardo Coutinho em sua obra é visível, e é notável na cena de abertura com a conversa entre pai e filha. Uma realidade do incomunicável que ganha palavras frente às câmeras. Algo triste e até mesmo cômico. A partir dessa cena, Nader constrói seu filme de modo muito particular e de perspectivas diversas. A própria, a de Nilson e da filha do caminhoneiro. Um trabalho primoroso no qual não existem loucos ou certos.
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