Crítica

Não é preciso ser muito versado na história do rock para saber da importância dos Stooges. Formada por Iggy Pop, Dave Alexander e os irmãos Ron e Scott Asheton, o grupo quebrou paradigmas e, no apagar das luzes da década de 1960, eram punks muito antes do conhecido movimento de contracultura realmente existir. Por terem sido tão precursores, muitos não entenderam a proposta. Os dois primeiros discos do grupo – The Stooges (1969) e Fun House (1970) – venderam quase nada na época do lançamento. Tanto que os membros do Stooges chegaram a se separar por um tempo, até voltarem – sem Alexander, com James Williamson assumindo as guitarras – para gravar o que seria seu último disco por muito tempo, o intenso Raw Power (1973). Iggy Pop seguiu sua carreira solo, gravando discos produzidos por David Bowie naquela mesma década, enquanto os irmãos Asheton se viram de volta à casa dos pais, sem dinheiro ou chance de melhores empregos. Em 2003, depois de uma reunião dos demais membros do Stooges, Iggy Pop resolveu se juntar aos amigos e fazer turnês com seu antigo grupo. Diferentemente do passado, fãs e a imprensa abraçaram essa volta dos Stooges com a devida atenção. O documentário Gimme Danger conta essa história.

Em 2008, Iggy Pop decidiu que a trajetória dos Stooges deveria ser contada. Para tanto, convidou o cineasta Jim Jarmusch para comandar o filme da forma como ele quisesse. Foram necessários mais de oito anos para que o longa-metragem pudesse ser lançado, visto que se tratava de um projeto independente, pago com fundos da produtora do cineasta. Nos intervalos de seus filmes Amantes Eternos (2013) e Paterson (2016), Jarmusch dava atenção ao documentário, montando o material que serviria de base para Gimme Danger. A entrada da Amazon Studios viabilizou a distribuição da produção, que entrou no catálogo do serviço de streaming em outubro de 2016, depois de ter passado por diversos festivais importantes, incluindo o Festival do Rio.

A estrutura de Gimme Danger não é inovadora como a banda, mas conta com depoimentos importantes dos principais membros do grupo. Infelizmente, Ron e Scott Asheton faleceram nos últimos anos (em 2009 e 2014, respectivamente), mas tem suas entrevistas costuradas à narrativa. Difícil dizer se Ron gravou especialmente para o doc, mas Scott, sim, estando ao lado de Iggy Pop, inclusive. Jarmusch inicia a história da banda no seu final, em 1973, quando o grupo ruía depois de mais um disco incompreendido e shows com público frustrante. Ele, então, retrocede para mostrar o passado do frontman dos Stooges – que iniciou como baterista, para só depois descobrir seu real talento como vocalista e performer – e o encontro com os demais membros da banda. O cineasta escolhe entrevistar apenas pessoas muito próximas, fazendo do filme um documento bastante íntimo da gênese e do fim dos Stooges.

Com bom ritmo e histórias interessantes, o documentário de Jim Jarmusch é essencial para entender (ou conhecer) essa banda tão paradigmática. Como os Stooges estavam longe de ser mainstream, as imagens de arquivo são escassas. Existem, aqui e ali, algumas cenas de shows ou fotos da época, mas nada que pudesse servir para cobrir todos os 107 minutos do longa. Por isso, a história oral é tão importante, com Iggy Pop servindo de cicerone àquela jornada. Como não poderia deixar de ser, a música também serve como catalizador para a narrativa, com clássicos como “I Wanna be Your Dog”, “T.V. Eye”, “Search and Destroy”, “No Fun” e a própria “Gimme Danger” deixando clara a influência que os Stooges tiveram nas bandas que surgiriam logo depois. Desde Ramones, na década de 1970, até White Stripes, nos anos 2000, é possível notar o dedo de Iggy e cia.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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