Crítica


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Sinopse

Os estigmas e os diversos obstáculos enfrentados pelos atletas LGBTQIA+ no mundo esportivo.

Crítica

Que os direitos LGBT e a luta contra a homofobia estão ganhando cada vez mais espaço e, ainda bem, conquistando novas vitórias, isto é público e notório, ainda que a passos lentos dependendo de onde se fala. Nos esportes, então, nem se fala. Ainda que haja nomes como o do nadador Tom Daley, que é assumido sem grandes fofocas ou problemas de patrocínio, muitos atletas homossexuais e transgêneros sofrem uma luta diária para não apenas sair do armário para treinadores e torcedores como para si mesmos. Por isto é tão importante que um filme como Game Face aborde esta questão, dando uma dinâmica de como o preconceito (muitas vezes velado) pode ser combatido.

O diretor belga Michiel Thomas, em seu primeiro longa-metragem, escolheu dois personagens da vida real para serem objetos de estudo de seu documentário. Uma mulher transgênero e um homem homossexual. Ela, Fallon Fox, uma lutadora de MMA. Ele, Terrence Clemens, da liga amadora de basquete. São lados opostos de uma mesma visão, não apenas pela questão de gênero em si, mas de como o "se assumir" pode ser penoso sob o ponto de vista profissional, ao mesmo tempo em que é libertador poder ser quem é de verdade. Fox conta que, quando revelou para um treinador sua transexualidade, a primeira reação do próprio foi que ela escondesse. Afinal, o meio é de um machismo absurdo, talvez pela própria violência do esporte que atrai muito mais a ala heterossexual, como um atestado de "macheza". Verdade é que muitos outros lutadores poderiam se recusar a competir com Fox por causa da sexualidade, da incompreensão. Algo que ela ainda tem medo, mesmo que hoje tenha mais armas e uma equipe de apoio de verdade ao seu lado. A lutadora não faz questão de esconder seu receio. Não é para menos.

Vemos o que acontece após sua identidade sexual se tornar pública. Ela é vaiada por torcidas rivais e uma oponente a provoca dizendo que "ela parece um homem". Isto para ficar em apenas uma questão. Com sua exposição, o tiroteio vem de todos os lados. O bom é que, em meio a tanta controvérsia, ela encontra apoio não só de seus patrocinadores, mas também da família, além de vários ativistas e do próprio Comitê Olímpico Internacional, que reconhece seus requisitos como atleta transexual. Porém, ela ainda precisa batalhar para firmar seu nome no UFC, o campeonato principal de sua modalidade e também onde o preconceito é ainda maior em busca de aceitação.

Já o outro personagem, à primeira vista, parece ter tido uma trajetória "mais fácil", se é que poderíamos chamar assim. Porém, Clemens passou por várias controvérsias desde sua saída da escola. Foram diversas bolsasde estudo rejeitadas, uma prisão de dez meses e um amigo ainda lembra da vez que ele perdeu uma chance profissional após um beijo gay em público. Por isso, o esportista é enrustido na maior parte do tempo, cuidando para que seu segredo não venha à tona e tire seu momento de brilho. A grande virada no meio desse caminho que perdurou por anos foi a revelação de que o famoso jogador da NBA, Jason Collins, saiu do armário. Clemens entra em contato com o próprio, que lhe dá vários conselhos. E quem poderia esperar que, ao se assumir perante um time de Oklahoma, num dos estados mais preconceituosos dos EUA, o rapaz encontraria tanto apoio, mesmo daqueles que ele nem esperava tanto? O documentário tem feito sucesso em vários festivais LGBT do mundo com um tema tão atual. Porém, como filme técnico, Thomas apresenta algumas falhas em sua direção, seja do início levemente confuso e de narrativa lenta (o que pode prejudicar o interesse pela história de seus dois personagens com tamanha "enrolação") e até uma falta maior de aprofundamento na questão do esporte em si, especialmente com Fox. Vemos lutas, tatames, gaiolas, mas pouco da profundidade técnica necessária para entender como funciona aquele mundo.

O belga se fia demais na história pessoal de Fox e Clemens, o que é algo a se comemorar, pois elas são fortes por si só, mas no saldo geral o longa fica no meio termo entre narrativas de vida e protesto contra preconceito nos esportes. Espera-se mais aprofundamento no decorrer do longa, quem sabe cutucando ainda mais o sistema esportivo não apenas no MMA e no basquete, mas em outras alas tão machistas quanto. Apesar disto, não deixa de ser uma arma poderosa para a luta incessante da comunidade LGBT ao redor do mundo, provando que é possível batalhar por aquilo - e por aqueles - que se ama. Afinal, não deveríamos ser diferentes em nossas peculiaridades, mas iguais perante o julgamento de todos?

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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