Crítica

Em Forma, Ayumi Sakamoto, o seu diretor, confiou mais no público do que deveria. Com um filme de estreia com mais de duas horas e vinte minutos de exibição, composto por cenas lentas, Sakamoto conseguiu mais silêncio do que repercussão, mesmo com a premiação do júri da crítica, no Festival de Berlim.

O enredo trata de nos apresentar a Ayako, funcionária de um escritório em Tóquio, por meio de uma primeira cena interessante. Nela, a jovem percorre solitária a sala em que trabalha com uma caixa na cabeça. A abertura pouco usual, arrastada, em enquadramento único, é o exemplo perfeito para antecipar o ritmo, o humor e a maneira idiossincrática com que a história será contada. É ao retornar para casa ao final do expediente que Ayako (Nagima Umeno) encontra Yukari (Emiko Matsuoka) em uma esquina qualquer. Antigas colegas de colégio, as jovens perderam o contato ao seguirem rumos diferentes. Agora, estão a fim de reatar os laços.

Durante um jantar, entre as trivialidades que ocuparam a vida de ambas durante o tempo sem se ver, Yukari revela estar cansada do atual trabalho. Como quem estende a mão prontamente, Ayako lhe oferece um emprego em seu escritório. Yukari se anima e aceita. O que parece uma relação amigável guarda traços mais profundos e antigos, advindos de um passado desconhecido pelo público. É por esse mundo sombrio, portanto, que o filme se desenrolará. O desconforto dos primeiros dias de Yukari no novo emprego parece algo menos natural quando presenciamos a personagem de Umeno revelar ao namorado da nova colega algo sobre o passado de Yukari.

Com roteiro de Ryo Nishihara, que atua no filme como o namorado de Yukari, Forma tem uma construção artesanal realmente interessante. O trabalho de Sakamoto consegue criar uma tensão rara, seja pelo ritmo das sequências ou pelo enredo que acontece mais no nível dos personagens do que do espectador. Aliás, a tática de privilegiar um lado da tela em detrimento do outro é constante no cinema oriental, e certamente um artifício mais refinado perto do que o suspense clássico pode nos proporcionar.

Pela sua forma – e o trocadilho aqui é menos inevitável do que preciso –, não se pode antecipar muito de Forma. É evidente a assimetria entre os dois primeiros terços do filme e o seu desfecho. Tão evidente quanto a duração em excesso, que se por um lado contribui para a intensidade do desfecho, por outro lado encontra o vazio em muitas cenas. Não é demasia dizer que o projeto ambicioso de Sakamoto se realiza parcialmente durante 100 minutos, e acontece plenamente apenas nos últimos 40 minutos, em que uma sequencia competente e estratégica refaz o filme por completo, dando forma a Forma – dando todo um novo sentido, mas que poderia ter sido antecipado.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação dos Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul, e da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Tem formação em Filosofia e em Letras, estudou cinema na Escola Técnica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Acumulou experiências ao trabalhar como produtor, roteirista e assistente de direção de curtas-metragens.
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