Espejuelos Oscuros
Crítica
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Sinopse
Esperanza é uma mulher cega que vive sozinha em uma casa isolada no campo de Cuba. Mario, um traficante em fuga da polícia depois de um assalto, decide se enconder na casa dela. Ele passa a demonstrar um interesse sexual pela cega e ela tenta desviar sua atenção contando as histórias que escreve de pessoas comuns.
Crítica
A mostra competitiva latina finalmente despertou no Festival de Gramado com a exibição de Espejuelos Oscuros, filme de estreia da cubana Jessica Rodríguez. A diretora subiu ao palco e surpreendeu a todos ao revelar - ou denunciar - a situação alarmante da participação feminina na produção cinematográfica da ilha. Apesar de Cuba ser um país conhecido pela tradição no cinema, simbolizada na fama mundial da Escuela Internacional de Ciny y Televisión, de San Antonio de Los Baños, Rodríguez contou ser a quarta mulher a dirigir um longa-metragem ficcional por lá. Longe de ser gratuita ou estatística, a introdução deu o tom da temática por detrás do que veríamos na tela durante os 90 minutos seguintes.
Esperanza (Laura de la Uz), uma mulher cega que mora sozinha, tem a casa invadida por Mario (Luis Alberto García). Inicialmente, o ladrão chega com a ideia de roubar os pertences e se esconder da polícia, mas decide estuprá-la ao se deparar com a fragilidade da dona da casa. Na tentativa de conter a violência, Esperanza tenta dissuadir Mario por meio da conversa. Ele acaba interessado nos textos escritos por ela, que abarcam um breve resumo da história de Cuba.
Cada história interrompe a narrativa em andamento e introduz uma nova encenação, interpretada sempre pela dupla de la Uz e García. Pontos marcantes dos regimes da ilha estão ali, como a famosa passagem da safra dos dez milhões, o embate dos estudantes com o governo do ditador Fulgencio Batista e a própria revolução cubana. Cumprindo dupla função, as histórias se interpõem à narrativa original como forma de preservar o avanço de Mario contra Esperanza, ao mesmo tempo em que impõe função temática, ao escancarar, quase na forma de provas, o papel secundário reservado às mulheres em Cuba, sendo tanto na área artística, como destacou a diretora no palco, quanto nos demais momentos, como figurantes de um país rigidamente masculino.
Em Espejuelos Oscuros, os óculos escuros usados pela protagonista fazem alusão metafórica à cegueira com que a sociedade cubana ainda encara a participação das mulheres na composição do país. Enquanto denúncia, representada desde o início pelo nome sugestivo da protagonista, o filme carrega consigo aspectos interessantes e certamente desconhecidos, dada a postura rígida com que o regime de Raúl Castro divulga a realidade e as verdadeiras demandas de sua população.
Inegavelmente interessante e necessário, o filme limita-se quase por completo no que tange ao seu conceito. O casal de atores tem um desempenho irregular, menos por culpa das atuações propriamente ditas do que pelo tom incerto imposto ao longa, alternando comédia e drama. Órfãos de uma guia que lhes dissesse aonde chegar, de la Uz e García encabeçam um filme que evolui com dificuldade e pouca desenvoltura. As restrições orçamentárias certamente influenciaram a limitação das locações e da construção visual, porém o cinema conta com vários exemplos em que a inventividade do roteiro, como visto unicamente no final do longa, permite elevar a narrativa a um outro patamar. Atravessado pelas encenações históricas, o ritmo pouco fluente e a narrativa de raros atrativos podem até motivar de maneira convincente os compatriotas da produção, mas certamente não despertam engajamento da plateia internacional.
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