Crítica

Com produção de James Cameron (Avatar, 2009) e roteiro e direção de Andrew Adamson (Shrek, 2001), finalmente chega aos cinemas o teatro circense que é sucesso por todo o mundo. Cirque Du Soleil: Outros Mundos, no entanto, é mais um experimento do que um filme propriamente dito. Afinal, quem de fato estava esperando – torcendo? – por essa transição dos palcos para as telas? Criado e desenvolvido para ser apresentado ao vivo, a magia e a sedução que o espetáculo possui se desfaz quando visto na sala escura, justamente pela falta daquilo que lhe é tão característico: fantasia.

Mia (Erica Linz) está caminhando a esmo até que as luzes de um circo lhe despertam a atenção. Atraída, adentra o lugar olhando tudo com muita curiosidade, até o momento em que recebe um folheto da apresentação do acrobata (Igor Zaripov). O rapaz, com quem ela havia trocado rápidos e interessados olhares segundos antes, é a atração mais esperada da noite, a qual todos esperam com ansiedade. No entanto, no meio da performance, ele se descuida e cai. Cai em queda livre, de encontro ao chão, à areia, ao infinito. O óbvio seria a morte dura e crua. Mas ao tocar no picadeiro, este se desfaz num funil imaginário que o leva – e a ela de arrasto – e um mundo fantástico e imaginário. Neste universo paralelo, os dois serão separados de forma quase irreversível, e enquanto lutam para se reencontrar os dois irão se deparar com alguns dos momentos mais marcantes da história do próprio Cirque du Soleil.

Como a sinopse acima dá a entender, Cirque Du Soleil: Outros Mundos nada mais é do que um medley (um pout-pourry? um mash-up?) com os melhores momentos de todos os shows já concebidos pelo grupo ao redor do globo. O foco está em sete deles: O, Mystère, Kà, Love, Zumanity, Viva Elvis e Believe. Os mais marcantes, principalmente para aqueles que não conhecem a companhia previamente, são os números retirados de Love (feito inteiramente com canções dos Beatles) e de Viva Elvis (da obra de Elvis Presley, obviamente). Para os já iniciados, por outro lado, a observação se torna exercício de adivinhação, uma vez que as apresentações não se comunicam entre si e são simplesmente alinhadas uma atrás da outra, sem uma sequência muito lógica, justificando a tentativa de descobrir de onde foram retiradas.

O teatro – ou o circo, no caso – torna-se mágico numa contrapartida com o público, que aceita o que vê sem questionar os fios, maquinários e demais trucagens que vemos, porém ignoramos em nome de um encanto maior. No cinema isso não pode se repetir, pois está é a arte do real, precisamos ver para crer. Ali, na tela, não queremos descobrir como os efeitos especiais foram feitos, pois dessa forma a magia se desfaz. No entanto, é justamente o que acontece com Cirque Du Soleil: Outros Mundos. Se num instante ficamos diante de cenários deslumbrantes e inimagináveis somente concebidos na ficção, logo em seguida nos deparamos com artistas pendurados por cabos, equilibristas previamente protegidos e malabaristas muito bem apoiados – exatamente como os vemos no palco. Mas a questão é: não estamos num teatro, e sim no cinema. Neste ambiente as regras são outras. E foi justamente esta compreensão que faltou para que este fosse, de fato, um filme, e não somente um registro filmado.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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