Crítica

Em 2005, a diretora Joana Nin estreou com Visita Íntima, vencedor do Festival É Tudo Verdade de 2006 na categoria curta-metragem brasileiro, e que construiu uma vitoriosa carreira em diversos festivais pelo mundo. O premiado curta é também a gênese deste novo projeto, que retorna ao universo carcerário brasileiro através do olhar das esposas, noivas e namoradas dos presidiários. Cativas: Presas Pelo Coração acompanha a rotina de sete destas mulheres que, mesmo do outro lado dos muros da prisão, dividem a penitência com seus amados.

Desde seus primeiros planos, o longa de Nin exige que o espectador dispa-se de seus preconceitos e, assim como o filme, evite confrontar de forma direta as questões da falência do sistema prisional no Brasil. Obviamente estes questionamentos são inevitáveis, e surgem durante a projeção, porém são abordados como elementos secundários, compondo um quadro principal que retrata como são afetadas as pessoas ligadas sentimentalmente e não criminalmente a este sistema.

Uma das escolhas de Nin para manter esse foco é não revelar os crimes dos condenados - algumas mulheres que só conheceram seus parceiros quando estes já estavam presos também dizem não ter essa informação – afinal, a investigação do longa não é policial, é emocional. Nesse campo das emoções, o amor pode ser visto tanto como um sentimento libertador quanto enclausurante, e aqui esta última visão ganha novos contornos. As mulheres, longe de seus parceiros, se sentem isoladas mesmo quando deveriam se sentir livres, só encontrando o sentimento de completude ao adentrarem a prisão.

Mesmo trabalhando com este conceito de difícil concepção para parte do público, o filme evita fazer julgamentos, algo que se torna um de seus principais méritos. A busca de Nin é pela humanidade existente na situação, e ela surge especialmente no senso de comunidade criado entre as mulheres, que trocam confidências, se apoiam e se transformam em uma família. E para a cineasta, o amor familiar - a possibilidade da formação de uma família – se apresenta como a última esperança para a reintegração social dos presidiários. As personagens também se mostram crentes nesta ideia, e por isso se mantêm fiéis diante das adversidades.

Para o homem privado das riquezas materiais, o único bem restante é sua palavra, e é exatamente a ela que as mulheres do filme se apegam. Através das cartas trocadas entre os casais, Nin tenta desvendar os mistérios desta ligação tão forte. Pois, a palavra é poderosa, superando barreiras físicas – além dos obstáculos gramaticais – para que os sentimentos sejam traduzidos para o papel, mesmo que acompanhados de lugares-comuns e de uma aura “brega”. Afinal, como falar de amor sem ser “brega”?

Mas, ainda que os sentimentos sejam genuínos, sua transposição para a tela ganha ares artificiais em determinados momentos. O longo tempo de convivência com a cineasta – algumas mulheres já estavam presentes no curta de 2005 – gera intimidade com a realizadora, mas também causa um efeito teatral na postura de algumas entrevistadas, como se já trouxessem um discurso preparado por terem a consciência de estar em um filme. Percebe-se esta perda de espontaneidade, por exemplo, na cena em que uma jovem procura imediatamente direcionar o olhar para a câmera, localizada à distância, antes de proferir uma frase para seu companheiro. Ou até mesmo na sequência que mostra um casal durante a visita íntima e que possui um tom demasiadamente encenado.

São segmentos que destoam bastante da crueza da cena da revista íntima a qual as visitantes são submetidas, ou da beleza bem calculada do plano da noiva caminhando até a capela do presídio. Os detalhes negativos, bem como a opção narrativa esquemática, impedem que o longa tenha um impacto maior, mas nem por isso esvaziam todo o potencial emocional ou a relevância do trabalho de Nin.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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