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Sinopse

Carrie é uma jovem tímida, perseguida pelos colegas, professores e impedida pela mãe de levar uma vida comum. No dia de sua formatura, descobre que possui poderes telecinéticos quando os jovens mais populares da escola a humilham diante de todos.

Crítica

São vários os exemplos da genialidade por trás de Carrie: A Estranha, um filme que se apresenta de modo delicado mas, sem perder tempo, logo começa a revelar sua verdadeira face. Muito, é claro, vem do texto de Stephen King – que aprova publicamente esta versão do seu trabalho, ao contrário do desprezo que afirma sentir pelo clássico O Iluminado (1980), de Stanley Kubrick, também baseado numa criação sua. Mas os dois pontos verdadeiramente fortes neste filme são a direção segura e objetiva de Brian De Palma, neste que foi seu primeiro sucesso de público e crítica, e a atuação arrebatadora de Sissy Spacek que, mesmo não tendo sido a opção inicial para o papel da protagonista e com 10 anos de idade a mais que a personagem, domina a cena como poucas, prendendo o espectador desde o início desta jornada de angústia e tensão.

Brian De Palma já tinha mais de 15 anos de carreira e nove longas-metragens no currículo. Entretanto, ainda não havia entregue algum dos trabalhos que o tornariam reconhecido futuramente. Stephen King, por sua vez, era apenas um professor em início de carreira, com muitos manuscritos, mas nenhuma publicação. A primeira foi lançada em 1974 e era baseada numa garota que havia conhecido na juventude e que muitos afirmavam possuir habilidades psíquicas. Logo após chegar às livrarias, esse livro se tornou um best seller, e sua adaptação para o cinema foi uma consequência natural. O resultado do encontro entre De Palma e King foi Carrie: A Estranha, filme que abriu os caminhos dos dois rumo à consagração.

Apesar do estilo do escritor ainda não ser popular, muito do sucesso deste filme se deve à direção precisa e econômica do cineasta, que sabia exatamente o que buscar nesta história sobre uma menina criada por uma mãe fanática, que aos poucos começa a desenvolver poderes de telecinese. A cena inicial já aponta para algo fora dos padrões: logo após ser ridicularizada pelas colegas durante um jogo de vôlei, Carrie, durante o banho no vestiário escolar, tem sua primeira menstruação. A garota, adolescente, se assusta com o sangue – ela não sabe o que aquilo significa, e o desespero se faz presente imediatamente. As outras meninas, ao invés de ajudá-la, aproveitam para atormentá-la ainda mais, com ataques que duram uma eternidade até que a professora intervenha.

É neste ponto em que se estabelecem três vértices entre as alunas: Carrie, a problemática vinda de uma família desestruturada; Sue, a que abraça o deboche mas logo se arrepende, tentando remediar suas atitudes na sequência; e Chris, a mais popular, que culpa aquela que não entende pelo castigo recebido por seus atos e decide se vingar durante o baile de formatura. Cada uma delas, por si só, poderia render uma linha narrativa por completo. Entendemos o que se passa com elas, e não são poucos que torcerão por uma em detrimento de outra sem, no entanto, que seja algo unânime. É curioso perceber, também, que nenhuma delas consegue atingir seus propósitos sem que tenham de pagar algo por eles. Neste conto em que o pecado possui um preço muito alto, qualquer passo em falso pode significar uma curva sem volta.

Sissy Spacek, como a protagonista, entrega uma atuação de muita intensidade, alternando momentos de pura doentia com outros de uma força insuspeita. Seus olhos são repletos de emoção, e é possível compreender através deles o turbilhão de emoções enfrentados pela personagem. Merecidamente foi indicada ao Oscar, sua primeira vez como finalista à mais importante premiação do cinema hollywoodiano das seis já recebidas até hoje (ganhou em 1980 por O Destino Mudou Sua Vida, de Michael Apted). Seu trabalho é tão intenso e arrebatador que prende a atenção do público por completo, se posicionando como uma parceira à altura de Piper Laurie (indicada ao Oscar e ao Globo de Ouro como Atriz Coadjuvante). Esta, no papel da matriarca alucinada, faz poucas aparições, mas todas muito marcantes. Os momentos das duas juntas representam verdadeiros embates, com diálogos afiados, intenções dissimuladas e muito suspense.

Brian De Palma combina, em Carrie: A Estranha, elementos como bullying escolar, fanatismo religioso, dificuldades de aprendizado e violência juvenil, todos envoltos em uma aura de puro terror e medo. Além de apresentar ao público pela primeira vez em destaque nomes como Stephen King, John Travolta e Amy Irving, o cineasta compõe um filme sutil, ainda que direto em suas intenções. A cena clássica do banho de sangue é somente o clímax de um enredo que espalha suas pistas e elementos precisos por toda a trama, sem pressa nem atropelamentos, mas com cuidado e planejamento. Ninguém em cena estará a salvo a partir do instante em que tudo aquilo que Carrie luta para manter abafado decidir se manifestar. E, assim que ela assumir o controle da situação ao seu redor, nada mais será o mesmo. Assustador – e, ainda assim, irresistível!

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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