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Sinopse

Por conta da comemoração dos 60 anos do Festival de Cannes, um dos mais importantes do mundo, 33 cineastas de 25 países são convidados a realizar curtas de três minutos para fazer parte de um mosaico.

Crítica

Encomendado pelo presidente do Festival e Cannes, Gilles Jacob, para celebrar os 60 anos do evento, a coletânea de curtas Cada Um Com Seu Cinema reúne 36 cineastas renomados para realizar pequenos filmes que seguem algumas regras básicas: ter a sala de cinema como cenário, ter em torno de 3 minutos de duração e tratar sobre o amor ao cinema.

Como costuma ocorrer com boa parte dos projetos deste tipo, o resultado não é homogêneo, especialmente por contar com um número tão grande de realizadores. Mas, ainda que seja irregular, a coletânea possui seus momentos inspirados e, no geral, consegue tratar de seu tema principal de uma maneira que mantém o interesse devido à diversidade de estilos dos diretores convidados. Essa diversidade, porém, não impede que vários curtas se identifiquem pelo mesmo tom: o melancólico. Salas de cinema vazias ou abandonadas aparecem em vários trabalhos, como no enigmático e visualmente hipnotizante The Electric Princess House, do chinês Hsiao-hsien Hou, e indicam um sentimento de saudosismo tanto em relação à produção cinematográfica de outras épocas quanto ao próprio ato de ir ao cinema. As referências a diretores clássicos e suas obras, apesar de inevitáveis, também se mostram sintomas desta visão saudosista. Entre os mais lembrados está Fellini, na bela homenagem do grego Theo Angelopoulos ao ator Marcello Mastroianni, com a presença de Jeanne Moreau, ou na figura da lanterninha que se emociona ao final de todas as exibições de (1963), no curta do russo Andrei Konchalovsky. Outro grande reverenciado é Godard, com as falas de Alphaville (1965) no filme de Wong Kar-Wai – marcado pelo seu característico trabalho de cores – ou com as cenas de Viver a Vida (1962) apresentadas no interessante curta de Atom Egoyan, um dos poucos que apontam para o presente/futuro, mostrando duas pessoas que assistem a filmes diferentes e descrevem o que estão vendo através de mensagens de celular. Bresson, Antonioni, Renoir e muitos outros também são lembrados ao longo da coletânea.

Os curtas que enveredam pela comédia acabam sendo os mais bem-sucedidos. O português Manoel de Oliveira brinca com o encontro entre o Papa João XXIII e Nikita Khrushchev, o italiano Nanni Moretti revisita salas de cinema relembrando de forma muito divertida os filmes assistidos nas mesmas e o finlandês Aki Kaurismäki apresenta a melhor (e mais infame) piada, ao mostrar os trabalhadores de uma siderúrgica que, após termino do expediente, vão ao cinema assistir a A Saída dos Operários da Fábrica Lumière (1895). Ainda no gênero cômico temos a gag um pouco óbvia, mas engraçada, de Roman Polanski em Cinéma Erotique, o espectador que enfrenta todos os tipos de contratempos de projeção no simpático trabalho do japonês Takeshi Kitano, o sarcasmo da crítica ao domínio dos blocksbusters presente no segmento do britânico Ken Loach, a comédia à la Buster Keaton do israelense Elia Suleiman e toda a ironia do “suicídio do último judeu do mundo no último cinema do mundo” de David Cronenberg.

Já nos trabalhos que buscam um lado mais emocional temos destaque para o sensível segmento dos irmãos Dardenne, para os autobiográficos de Tsai Ming-liang, Claude Lelouch e Abbas Kiarostami, o do mexicano Alejandro González Iñárritu, que pesa a mão no final, mas emociona com sua espectadora cega (ideia recorrente em outros curtas, como no do chinês Kaige Chen) e no simples e bem resolvido segmento de Gus Van Sant, First Kiss, que trata da magia do primeiro beijo como um grande evento cinematográfico. Há ainda diversas outras abordagens, que variam entre bons e fracos resultados. Os interessantes e indecifráveis episódios de David Lynch (como já era de se esperar), do chileno Raoul Ruiz e de Olivier Assayas, a surrealista “mulher-barata” da diretora Jane Campion, o semi-documental de Wim Wenders, o deslocado curta do brasileiro Walter Salles com os repentistas Castanha e Caju, a crítica política nada sutil de Amos Gitai, a auto-homenagem do egípcio Youssef Chahine e os outros não citados.

Ao final, mesmo que possa ficar um pouco aquém de todos os talentos envolvidos, Cada um Com Seu Cinema cumpre seu papel de mostrar a paixão pela sétima arte sob óticas distintas, além de ser um divertido exercício cinéfilo de identificação de características autorais, já que os nomes dos cineastas são revelados apenas ao final de cada curta.

Observação: a edição em DVD lançada no Brasil não possui os ótimos episódios dirigidos pelos irmãos Joel e Ethan Coen e por Michael Cimino

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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