Crítica


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Sinopse

Estudante de Astrofísica na Universidade de Edimburgo, Amy mantém um romance secreto e duradouro com o famoso astrofísico Dr. Ed Phoerum. Quando ele some, ela fica insegura quanto aos rumos a seguir.

Crítica

A ciência diz que ao olharmos para as estrelas, estamos contemplando o passado. Isso se deve ao fato de que a luz emitida por elas leva um longo tempo atravessando o espaço até se tornar visível para nós e, portanto, há uma grande probabilidade de que aquilo que vemos já não exista mais em sua forma original ou até tenha desaparecido completamente. É a partir deste conceito já bastante difundido que o italiano Giuseppe Tornatore constrói a analogia principal que fundamenta seu novo trabalho, Lembranças de um Amor Eterno. Principal, mas não única, já que logo na cena de abertura, o cineasta abusa das metáforas sobre astronomia presentes nas declarações apaixonadas do casal Edward Phoerum (Jeremy Irons), renomado professor de astrofísica, e Amy Ryan (Olga Kurylenko), sua ex-aluna e amante.

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O encontro entre os dois, que acontece num quarto de hotel, vem também carregado de uma intensidade corporal que Tornatore faz questão de registrar de modo íntimo. Os toques, os abraços e os beijos são valorizados pelos planos, já que, como descobriremos logo depois, esta será a última vez os veremos juntos fisicamente. Após se despedirem, ambos voltam para suas rotinas – Edward para suas pesquisas e sua família e Amy pra suas aulas e seu trabalho como dublê cinematográfica – mantendo contato apenas virtualmente (Skype, e-mails e mensagens de texto). Tudo corre normalmente, até que um dia a morte do astrofísico é anunciada, o que atormenta a garota não só pela tragédia em si, mas também pelo fato de continuar recebendo mensagens e presentes de seu amado.

Este início aponta para a possibilidade do suspense, terreno já explorado por Tornatore anteriormente, como em O Melhor Lance (2013) ou no excepcional Uma Simples Formalidade (1994). Esta sugestão, porém, se mostra apenas um blefe não sustentado pelo diretor, que rapidamente oferece a reposta para seu enigma. O que lhe interessa, de fato, é a exploração dos dramas que envolvem o casal, como o da aceitação da perda. O grande problema desta proposta de Lembranças de um Amor Eterno é que, assim como ocorre entre os protagonistas, há um grande distanciamento entre o público e os conflitos apresentados. Algo que se mostra fruto da aura artificial que envolve o longa, começando pelos diálogos, repletos das já citadas analogias, que não fluem naturalmente e raramente soam verdadeiros.

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Esta artificialidade por vezes aparenta ser intencional, especialmente no exagero das cenas protagonizadas por Amy na função de dublê, como se Tornatore pretendesse brincar com o poder de ilusão do cinema. Acontece que o filme nunca se assume plenamente como fantasia; ao contrário, a narrativa é dominada por um tom excessivamente sério e trágico que não permite a fuga da realidade. Isto faz com que a implausibilidade das situações – particularmente o elaborado esquema de comunicação criado por Edward, essencial para a trama – seja extremamente difícil de ser aceita, pois não basta que o apelido do professor seja “wizard” (mago) para validar o absurdo timing do personagem em relação às encomendas enviadas para Amy.

A direção de Tornatore exibe a elegância e a qualidade técnica esperada, vide as belas sequências passadas no interior da Itália. Contudo, este registro esbarra na solenidade, inibindo uma conexão mais acentuada com o espectador que nem mesmo a bela trilha sonora do mestre Ennio Morricone é capaz de estabelecer. A falta de aprofundamento na construção psicológica dos personagens principais durante a primeira metade da projeção também contribui para essa sensação de indiferença, já que a história depende basicamente da interação entre Ed e Amy, sendo que quase todas as figuras que os cercam pouco acrescentam (o advogado, os amigos de trabalho dela). Há ainda a filha de Ed, cujo pouco tempo em cena é marcado por atitudes bastante improváveis, servindo, tal qual os outros, apenas como mera engrenagem para que o plano criado pelo pai funcione.

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No ato final, Tornatore tenta dar mais peso à essência dos protagonistas, sobretudo Amy, que até então se limitava ao amor por Ed. Infelizmente, o cineasta se vale de saídas simplistas, como a questionável decisão de expor diretamente o estado emocional e o passado da garota através dos vídeos gravados por ela, ou a revelação de seus traumas e do relacionamento conturbado com a mãe, que parecem existir somente para desencadear uma transformação final – simbolizada na cena da exibição da escultura à qual Amy serviu de modelo. Olga Kurylenko demonstra empenho no papel, fazendo o possível com o que lhe é oferecido. Já Jeremy Irons repete um tipo recorrente nos último anos de sua carreira, ancorado quase exclusivamente na capacidade de transmitir uma imagem respeitável e distinta. Ambos ficam à mercê das divagações metafísicas do roteiro, quase sempre envoltas em certa ingenuidade, como o conteúdo da tese de graduação da garota. Existem algumas reflexões interessantes – sobre o egoísmo inerente aos relacionamentos – mas o impacto individual destas não é capaz de elevar a força do conjunto. Fica claro que Tornatore realmente acredita no teor deste discurso, contudo, fica também a sensação de que o cineasta vaga solitário na imensidão do espaço agarrado à sua crença.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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