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Sinopse

Três irmãs precisam voltar para casa a fim de cuidar da mãe que está com câncer. Porém, esse retorno provoca uma série de conflitos e traz à tona segredos nunca antes revelados.

Crítica

Violet está com câncer na boca. Barbara recentemente foi traída pelo marido com uma mulher mais nova. Ivy a vida inteira foi preterida pelos pais em favor das irmãs, e está agora apaixonada pelo primo-irmão. Karen está noiva de um homem mais velho já separado três vezes. E Beverly, marido da primeira e pai das seguintes, acabou de se matar. Estes são apenas os problemas mais evidentes – sim, pois há muito mais – dos personagens de Álbum de Família, drama levado às telas por John Wells, o mesmo de A Grande Virada (2010), em sua segunda experiência na tela grande.

Há muito a se destacar nessa produção, e os principais atrativos, é preciso concordar, não começam pelo nome do diretor – profissional mais conhecido por seus trabalhos na televisão. Afinal, estamos falando de um filme estrelado pelos vencedores do Oscar Meryl Streep, Julia Roberts e Chris Cooper, além das indicadas Juliette Lewis e Abigail Breslin e dos populares Ewan McGregor, Benedict Cumberbatch, Margo Martindale, Sam Shepard, Dermot Mulroney e Julianne Nicholson. Mas há outra pessoa, talvez não tão familiar do grande público, mas igualmente importante, que merece uma atenção especial: Tracy Letts. Ele, afinal, é o autor do roteiro e da peça original, vencedora do Pulitzer e do Tony. Responsável também pelo texto do espetacular Killer Joe (2011), Letts mais uma vez recai seu olhar na intimidade de uma família do interior dos Estados Unidos, desconstruindo-a lentamente e sem piedade, até que não sobre, literalmente, pedra sobre pedra.

A matriarca Violet (Streep, feroz e irascível) se vê novamente circundada pelas filhas após a morte do marido (Shepard). Barbara (Roberts, desprovida do seu glamour habitual) levanta da cama onde a depressão a jogou para estar com a mãe, levando consigo o marido (McGregor) e a filha adolescente (Breslin). Ivy (Nicholson, de Deixe a Luz Acesa, 2012) é a filha que sempre esteve por perto – e, talvez por isso mesmo, nunca tenha sido valorizada à contento. E Karen (Lewis, aproveitando muito bem o pouco que lhe é oferecido), a caçula, é a mais tresloucada, feliz com o noivado próximo com um homem de negócios (Mulroney) e preocupada apenas em manter as aparências antes que tudo venha abaixo. Há ainda a irmã de Violet, Mattie Fae (Martindale), que comprova que a crueldade talvez seja algo de família. Ela aparece ao lado do marido pacato (Cooper, sempre uma presença marcante) e do filho subestimado (Cumberbatch, numa participação de prestígio, porém bastante limitada).

O reencontro familiar é motivo suficiente para que todos os esqueletos há anos guardados nos fundos dos baús venham à tona com impressionante velocidade. Este é o ponto frágil de Álbum de Família: a falta de habilidade do realizador em dispor de tantos elementos polêmicos. Há a viúva viciada em comprimidos, a adolescente descobrindo a sexualidade, os primos apaixonados que são mais próximos do que imaginam, a infidelidade conjugal que ultrapassa gerações, o desespero pela felicidade que nunca chega e a angústia por um dia melhor que é sempre boicotado justamente por aqueles que são os mais próximos. Há muito a ser discutido, e tudo é explorado a exaustão – a cena do jantar pós-funeral, absolutamente eletrizante, se salva única e exclusivamente pela excelência do elenco e pela força das palavras, que tomam conta da ação sem dar espaço ao diretor além de coordenar a fotografia para que nada se perca. Mas é pouco, diante de tudo que está sendo oferecido.

Em última instância, temos um desempenho assombroso de Meryl Streep – uma vencedora de 3 Oscars que não tem mais nada a provar, e no entanto está novamente dando a cara à tapa numa atuação incrível, digna de muitos aplausos – e uma Julia Roberts que mostra, finalmente, que por baixo do status de megastar hollywoodiana há, sim, uma grande atriz. Mas enquanto filme, Álbum de Família não consegue ir muito além das várias discussões familiares que todo mundo já experimentou em sua própria casa uma vez ou outra. O resultado tende o tempo todo para o exagero, com tintas carregadas que marcam bem os pontos a serem discutidos. O final, neste sentido, é bastante exemplar, ao apontar a fuga única e simples como resposta para tudo. No entanto, assim como um dos personagens afirma em cena, nada é preto ou branco: o mundo é composto pela variedade de cores existentes entre um limite e outro. É uma pena que o filme não se situe neste meio-termo, sem verdades absolutas, e ao invés disso prefira investir nos extremos. Estes conseguem com eficiência provocar choque e descontrole, porém não perduram com segurança.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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