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Sinopse

O artista chinês Ai Weiwei construiu sua obra através do questionamento de valores culturais e políticos e na defesa da liberdade de expressão. Entretanto, depois de denunciar os Jogos Olímpicos de Pequim como propaganda do Partido Comunista, ele teve seu blog proibido.

Crítica

Há dois aspectos muito interessantes no documentário Ai Weiwei: Sem Perdão. O primeiro, e principal, é a apresentação do artista que dá nome ao filme, um dos mais controversos e provocadores da China. O segundo, adjacente, embora não menos importante, é o questionamento sobre as verdadeiras natureza e função da arte. Há uma busca pelo entendimento mais amplo tanto do ser/fazer artístico, quanto e, sobretudo, das ideias e atitudes enquanto agentes concretos de mudança. A diretora Alison Klayman observa o modo de produção de Ai Weiwei, sua atuação como idealizador de peças que outros artistas/artesãos criam efetivamente. Como exemplo, a instalação que distorce a mobília chinesa, uma tentativa bem-sucedida de colocar em xeque a tradição, os valores intrínsecos ao regime que governa o país com punho de ferro há bastante tempo.

O trabalho sai das galerias, transcendendo, assim, os espaços cativos da arte. Após um terremoto que vitimou mais de cinco mil crianças, Ai Weiwei resolve burlar uma confidencialidade conveniente ao governo chinês – já que divulgar o número de vítimas levantaria suspeitas, inclusive, sobre a qualidade das obras estatais – e empreende, ele próprio, a contagem, batendo de porta em porta com a ajuda de voluntários. Além de nominar os mortos, fazendo com que estatísticas ganhem vida e personalidade, Weiwei provoca os poderes instituídos, conscientizando quem está disposto a lhe ouvir sobre a forma como povo chinês é conduzido pelas autoridades. Nesse ponto, Ai Weiwei: Sem Perdão ressalta a importância da internet nas intervenções, seja via blog ou twitter.

Então, o artista assume para si, abertamente, a despeito das constantes ameaças e até das agressões físicas sofridas, um papel fundamental na sociedade em que está inserido, o da luta pela modificação do status quo. Claro que isso, inevitavelmente, esbarra numa ligeira idealização, efeito-colateral menor. O motor do ativismo registrado em Ai Weiwei: Sem Perdão é a arte inserida no cotidiano das pessoas como elemento contundente e imprescindível de transformação. Acompanhamos Weiwei gravando documentários contra a truculência policial, criando algumas das exposições que viajam pelo mundo – com destaque para as realizadas em Berlin e Londres – postando selfies dignos de sua iconoclastia e até mesmo convivendo com a agonia da mãe, temerosa que ele seja silenciado.

O documentário celebra Ai Weiwei como uma voz dissidente imprescindível à luta pela liberdade, exemplo que vai além das próprias causas e do Estado específico contra o qual bate de frente muitas vezes. O artista/ativista é visto como uma espécie de profeta que usa os meios à disposição para provocar pequenas revoluções no pensamento alheio. Pode-se objetar certa glorificação, pois são pouco exploradas algumas áreas cinzentas – vide o filho fora do casamento – mas esse é um dado quase insignificante, até mesmo porque o filme deliberadamente pretere o homem em benefício do ícone. Ai Weiwei: Sem Perdão é importante por mostrar alguém lutando para garantir direitos vitais, em constante confronto com um entorno política e socialmente reprimido, ou seja, algo necessário na contramão da venosa alienação.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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