Crítica

Imagine perder um grande amor e anos depois ter a chance de reconquistá-lo? A premissa, básica na maioria dos filmes existentes, tem uma chance de ser tratada de forma madura e realista no drama chileno A Vida dos Peixes. Aqui temos Andrés (Santiago Cabrera), jornalista que trabalha em uma revista de turismo em Berlim e retorna dez anos depois ao Chile para a festa de aniversário de um de seus melhores amigos. Mas antes, já no início do filme, ele reencontra sua antiga turma e vemos o primeiro ponto forte da película: apesar da amizade aparentar estar intacta, há tanto tempo o grupo não se reúne que parecem desconhecidos um ao outro, a ponto de um não saber o que o outro faz da vida.

Porém é na festa que há o principal assunto de A Vida dos Peixes: Andrés reencontra Beatriz (Blanca Lewin), seu grande amor, que agora é casada e tem dois filhos. Há dez anos eles “deram um tempo” e combinaram de tomar um café alguns meses depois para ver o que podiam fazer a respeito da relação. Mas será que esse encontro deu certo? Um nunca esqueceu o outro e a forma como ambos se tratam reflete esse sentimento negado. Um misto de vergonha e paixão contidas. O grande problema é que Andrés sempre se mostra egoísta, pensando no que perdeu, mas não tendo coragem de mudar sua vida para lutar de verdade por Beatriz. Aliás, será que alguma vez ele realmente lutou? Ou foi ela apenas que conduziu essa relação?

Entre os encontros e desencontros com Beatriz, o personagem realmente parece um peixe no aquário, indo a esmo de um lado a outro sem nunca se libertar de sua prisão emocional. Dentro da casa onde ocorre a festa ele encontra uma antiga amiga (e affair de uma noite) que agora está grávida. Em seguida entra num quarto onde dois adolescentes estão jogando videogame e fazem perguntas sobre sexo a ele. Ainda temos a filha de um dos seus amigos, que nutre uma paixão de infância por Andrés e a triste mãe de um dos seus quase irmãos, já morto. Todos esses encontros, apesar de parecerem descartáveis no todo do filme, refletem o quanto o personagem de Santiago Cabrera é apático (ou seria um problema de atuação?) sobre quem e o quê o cerca e todos o fazem lembrar, seja através de lembranças do início da vida adulta, da paixão adolescente ou do sexo, do quanto ele perdeu ao deixar Beatriz. Tudo isso até ele se encontrar novamente com seu amor. E, sob a muralha de um aquário, encaramos um diálogo sofrido e esperançoso ao mesmo tempo sobre qual rumo o antigo casal deve tomar. Afinal, eles querem e vão ficar juntos?

A resposta pode estar na essência dos personagens: Andrés é um turista na vida que nunca se apega a alguém ou lugar algum, vivendo um eterno tédio com um trabalho que ele parece não gostar de fazer, além de estar longe de todos que ele, aparentemente, gosta. Ele nunca se esforçou para estar junto e vive uma eterna imaturidade. Já Beatriz seguiu sua vida, mesmo que a contragosto, e encontrou um bom homem que lhe deu uma família. O que pesa mais? A estabilidade do casamento com alguém que lhe respeita ou a dúvida de ser abandonada de novo, mesmo que seja por aquele que ela ama em segredo há tantos anos? A resposta vai muito além do final do filme, que nos deixa com outra pergunta: afinal, vale a pena?

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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