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Sinopse

Trágicos acontecimentos sobrevém à constatação, por parte de um sujeito, de que um amor do passado se transformou em sua nova vizinha. Ambos se comportam inicialmente como se nada tivesse acontecido. Todavia, em pouco tempo o caso é reiniciado. A situação se torna especialmente tensa pelo fato de ambos serem casados.

Crítica

O amor pode ser uma doença? No caso dos protagonistas de A Mulher do Lado, penúltimo filme do cineasta François Truffaut, a resposta é um sonoro sim. O francês aponta sua câmera para situações que extrapolam a paixão desenfreada, o desejo ardente, o amor cego, nos apresentando dois amantes que perdem completamente o prumo. Em atuações cheias de nuances, Gérard Depardieu e Fanny Ardant vivem os protagonistas desta história, formando um casal que não consegue viver junto, tampouco separado.

No roteiro de Truffaut, Suzanne Schiffman e Jean Aurel, conhecemos Bernard (Depardieu), casado com a bela Arlette (Michèle Baumgartner) e pai do menino Thomas (Olivier Becquaert). Quando ele observa um novo vizinho se mudando, o simpático Phillip (Henri Garcin), logo oferece ajuda e tenta fazer amizade. Mal ele sabe que a esposa de Phillip é Mathilde (Ardant), mulher que o deixou há oito anos, em um relacionamento partido que afetou profundamente os dois lados. Ambos tentam fugir da tentação, mas com o pecado morando ao lado fica difícil escapar. Logo o ex-casal parte para um caso extraconjugal e, a cada novo encontro, os sentimentos do passado se misturam com os do presente, os envolvendo em uma teia perigosa de desejo, ciúmes e possessão.

O maior mérito de A Mulher do Lado é sua imprevisibilidade. Histórias de traições nós vemos aos montes no cinema, mas a forma como Truffaut costura sua trama nos impede de prever o próximo passo dos personagens. E isso acontece graças a um recurso inteligente utilizado pelo diretor ao desvelar pouco a pouco o que aconteceu àqueles dois. Como não temos todas as informações do passado, fica difícil tentar prever o futuro do que se está acompanhando.

Outro ponto elogiável e que vai muito ao encontro deste mistério que Truffaut nos apresenta é a construção dos personagens. Vamos conhecendo gradativamente cada um deles. E ainda que o destaque óbvio fique para os dois protagonistas, existe espaço para os coadjuvantes, que ganham muito o que fazer. Desde a simpática madame Olive Jouve (Verónique Silver), que também viveu um caso de amor doentio no passado e sofre ainda no presente com as suas sequelas; passando por Phillipe, um homem que pensa ser sua última chance de felicidade estar casado com Mathilde; e chegando a Arlette, uma mulher devotada ao marido e que tem reações bem diferentes do que se poderia imaginar quando confrontada com certas verdades.

Essa trinca forte de coadjuvantes dá ainda maior projeção para a dupla de protagonistas, cujas atuações são brilhantes. Fanny Ardant, indicada ao César por sua performance, pontua muito bem os problemas pelos quais passa sua personagem. Primeiramente tentando resistir à tentação, ela se entrega de corpo e alma a um relacionamento às escondidas, vivendo um turbilhão de sentimentos que afeta diretamente sua saúde - mental, inclusive. Do outro lado da situação - ou da cama - está Bernard, um homem que tenta manter as aparências, mas não consegue fugir de seus sentimentos. Uma das cenas mais interessantes mostra Depardieu perdendo as estribeiras e abrindo o jogo durante um almoço comemorativo na casa de seus vizinhos.

François Truffaut constrói tudo isso sem pressa alguma. Os pontos-chave da trama vão acontecendo de forma parcimoniosa e o diretor aponta sua lente como se tentasse entender o que acontece com seus protagonistas, sem julgamentos. É um verdadeiro estudo de personagens, feito por um grande cineasta, infelizmente já no fim de sua vida.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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