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Sinopse

Acadêmicos cheios de sonhos nos anos 1970, Erik e Anna montam uma comunidade num elegante bairro de Copenhague. O objetivo é partilhar o cotidiano com outras pessoas, viver em conjunto. Mas, um caso amoroso acaba abalando esse suposto idílio utópico.

Crítica

O início de A Comunidade pode enganar o espectador menos atento a respeito da filmografia do cineasta dinamarquês Thomas Vinterberg. Com um primeiro ato divertido, mostrando os momentos iniciais de um novo arranjo social, no qual uma família tradicional abriga em sua casa amigos e desconhecidos, formando uma verdadeira comunidade naquele lar, é possível que o público acredite estar à frente de um feel good movie. Mas quando a história começa a se desenrolar, percebemos que aquilo era apenas a ponta do iceberg. E os relacionamentos que antes pareciam sólidos como rocha podem simplesmente desaparecer – com cada um daqueles personagens tendo apenas a si mesmo para culpar.

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Vinterberg se junta novamente ao roteirista Tobias Lindholm, com quem assinou o intenso e premiado A Caça (2012), para contar a história do casal Erik (Ulrich Thomsen) e Anna (Trine Dyrholm) em meados da década de 1970. Vivendo junto da filha adolescente Freja (Martha Sofie Wallstrom Hansen), a família tem uma vivência harmoniosa e bastante carinhosa. Erik é professor universitário, Anna é uma apresentadora de televisão, ambos bem-sucedidos profissionalmente. Quando o pai de Erik morre e deixa uma casa enorme como herança, Anna o convence a não vender o imóvel, mas se mudar para lá. Relutante, o homem aceita a ideia quando sua esposa revela que precisa de mais emoção em sua vida. Nesse momento, eles são apenas 3. Mas ela precisa mais. Ela deseja transformar sua casa em uma comunidade e convidar alguns amigos para morar junto deles. Então, são chamados Ole (Lars Ranthe), Mona (Julie Agnete Vang), o casal Steffen (Magnus Millang) e Ditte (Anne Gry Henningsen), junto de seu filho pequeno e Allon (Fares Fares), um desconhecido que se agrega ao grupo. Definidos os membros da comunidade e suas responsabilidades, a vida segue com momentos felizes, embora Erik ainda se mostre um tanto avesso à ideia. Não demora para que ele acabe se envolvendo com uma aluna, Emma (Helene Reingaard Neumann), mudando ainda mais o status quo. Como Anna reagirá a isso?

Em A Comunidade, Thomas Vinterberg propõe um estudo, não de personagens, mas de situações. Boa parte dos amigos que surgem na história não ganham muito tempo para serem desenvolvidos, o que acaba sendo um desperdício. No entanto, o cineasta consegue se debruçar intensamente no que incide sobre o casal principal e em como isso acaba influenciando aquele cenário. Como um artista curioso, ele parece se perguntar: o que acontece com um casamento aparentemente feliz quando se modificam as regras, quando são inclusas mais pessoas no seio familiar sem que os dois lados da história estejam plenamente investidos na mudança? Vinterberg responde essa questão com traição, ciúme e depressão.

Da forma como é construído, o roteiro acaba pegando muito mais pesado com Anna do que com seu marido, Erik. Foi dela a ideia da comunidade, ela quem quis compartilhar sua casa e propor maior liberdade ao casal. Quando viu que o seu companheiro acabou abrindo os olhos para suas alunas (Emma era estudante desde o começo do curso e ele só foi percebê-la agora, no terceiro ano), tenta não se incomodar com isso. Anna chega a sugerir que Emma vá viver junto deles, quando percebe que o sentimento do marido é sério por aquela mulher mais jovem. Com isso, no entanto, ela constrói um cenário que acaba inabitável para ela própria. Talvez fosse melhor uma divisão de consequências para ambos, mas Vinterberg acaba sendo duro demais com sua protagonista, deixando muito clara a sua crença de que cada um deve pagar pelos seus erros ou ações em seus filmes. De qualquer forma, o peso da personagem cai como uma luva para o talento de Trine Dyrholm, que nos conduz com maestria dos momentos solares de Anna até os mais sombrios. Não a toa, a atriz levou o prêmio no Festival de Berlim por sua impactante performance.

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Mesmo que tenha alguns poréns, A Comunidade é um daqueles filmes em que o espectador consegue se envolver e ter empatia com cada um dos personagens que habitam aquela trama. Vinterberg constrói um drama com toques cômicos que cativa pelo cenário, que faz pensar pelos desdobramentos da trama e que entretém até nas menores subtramas – a do menino prestes a morrer e a do florescimento da filha são bons exemplos de histórias menores, mas que agregam muito ao todo. O longa-metragem pode não ser tão memorável quanto Festa de Família (1998) ou tão doído de se assistir quanto A Caça (2012), mas tem predicados que mostram o sempre presente talento deste cineasta dinamarquês.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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