Ainda que não seja – ao menos até agora – um dos artistas mais populares do Brasil, e isso em parte pela pouca presença em produções televisivas, Rômulo Braga é, por outro lado, um dos nomes mais ativos do atual cinema nacional. Desde sua primeira aparição na tela grande, como um líder estudantil no drama histórico Batismo de Sangue (2006), já foram mais de uma dezena de projetos diferentes, ao lado de nomes como Sandra Kogut, Vinicius Coimbra, Lírio Ferreira, Caetano Gotardo e Marcelo Gomes, entre outros. Premiado no Festival do Rio como Melhor Ator Coadjuvante por Sangue Azul (2014), Braga tem vivido agora o melhor momento de sua carreira: além de ter participado do Festival de Berlim com Joaquim (2017), assume pela primeira vez a posição de protagonista no drama Elon Não Acredita na Morte (2016), que lhe valeu o Candango de Melhor Ator no Festival de Brasília do ano passado. E foi sobre este e outros momentos importantes em sua carreira que o ator conversou com exclusividade com o Papo de Cinema. Confira!

 

Olá, Rômulo. O que lhe atraiu no personagem de Elon?
Oi, cara. Tudo bem? Que prazer falar contigo. Pois então, o Elon foi um grande presente que caiu no meu colo. A história de como isso aconteceu, no entanto, é um pouco longa. As filmagens de Elon foram em 2015, e dois anos antes, ou seja, lá por 2013, eu participei de um projeto em Belo Horizonte chamado Janela de Dramaturgia. E, num destes encontros, quem apareceu foi o Ricardo (Alves Jr., diretor do filme), que tinha apenas o roteiro naquele ponto, e o levou para que fosse lido. Ali foi meu primeiro contato com o personagem, e desde o começo foi como se ele fosse parte de mim, entende? O roteiro era bem diferente do que acabou sendo filmado, mas já me deixou apaixonado. No entanto, o Ricardo nunca disse que havia escrito para mim, que se virasse filme eu seria convidado ou algo do gênero. Sempre foi um jogo muito honesto, ele me dizia que eu estava no páreo, que havia a possibilidade, mas nunca chegou a me dar qualquer tipo de garantia. Ou seja, enquanto o elenco não fosse fechado, não havia nada certo. Eu, no entanto, havia ficado fascinado pelo que havia lido, pelo personagem, pela estrutura da história. Bom, o tempo passou, o filme começou a se concretizar e o convite veio. No entanto, quando começamos as filmagens, o Ricardo teve outro toque genial. Ele foi esperto o suficiente para desconstruir tudo isso que havia dentro de mim, toda essa expectativa. Conseguiu me pegar do zero. Isso foi ótimo, pois continuei pesquisando, caminhei muito pelas ruas de Belo Horizonte, tudo movido pela paixão que sentia. Foi precisa que eu me voltasse para a fisicalidade que ainda não havia explorado, num sentido de pró-atividade. Isso foi me deixando cada vez mais instigado. Foi um processo muito laborioso, mas também muito leve e prazeroso.

Cena de Elon Não Acredita na Morte

Elon está passando por uma situação complicada devido a sua relação com Madalena. O quanto do filme realmente acontece e o quanto está se passando apenas na cabeça dele?
Pois é, essa é a grande questão, não é mesmo? Acho que tudo depende do quanto ele próprio está na cabeça de quem o assiste. O filme propõe uma aproximação forte com o personagem. Não só pelas imagens, mas também pelo som. Na primeira cena, quando o Elon está no hospital, como que do nada vem um som de trás. Quando assisti ao filme pela primeira vez, lá em Brasília, eu mesmo levei um susto, pois achei que fosse de fora da sala, mas era o próprio filme. Ou seja, são várias camadas que vão sendo construídas a partir de todos os sentidos. Nós somos convidados a entrar na cabeça do Elon. Essas ferramentas do audiovisual são úteis para isso, pois vão construindo essa identidade, julgando o personagem, possibilitando que o espectador se veja naquela situação.

 

A sua carreira no cinema já tem mais de dez anos. Elon Não Acredita na Morte, no entanto, é o seu primeiro protagonista. O que ele lhe representou em termos de desafio?
É uma pergunta capciosa, mas prometo que não vou escorregar. É claro que o Elon tem uma importância enorme. Pra começar, algo que é impossível negar, pois ele tem uma coisa significativa, que é o tempo de tela. Então, só por isso, já não dá pra comparar com os outros. Pois em meus trabalhos anteriores, tudo era dividido. Em As Horas Vulgares (2011) era eu e o João Gabriel, em Teobaldo Morto, Romeu Exilado (2015) estávamos eu e o Alexandre Cioletti. No O Que Se Move (2013) eu apareço em apenas uma das três histórias. Mas aqui não, a gente teve mais tempo para construir nuances, para se aprofundar no personagem e no drama que ele está vivendo. Só por isso, já se torna o filme mais importante que fiz até hoje.

Alexandre Cioletti e Rômulo Braga em Teobaldo Morto, Romeu Exilado

Por Elon Não Acredita na Morte você foi premiado como Melhor Ator no Festival de Brasília. O que essa conquista significou para você?
Rapaz, não consigo mensurar isso. Fiquei feliz, surpreso. Não esperava de forma alguma. Nem estava na cerimônia de premiação, fui até Brasília, claro, mas para ver o filme na tela e confraternizar com as pessoas, saber o que acharam, conversar, trocar. Depois, cumprida essa parte, é vida que segue. Acabei indo embora, tinha outros compromissos, não lembro. Mas lamento, pois não realizei de imediato o que havia acontecido, acabou ficando uma coisa meio suspensa. Fiquei muito feliz, lisonjeado com o reconhecimento. Quando me avisaram, quase não acreditei. Mas não consigo entender bem ainda o que significa. Foi um prêmio também para o coletivo, pois o ator é ainda o câmera, o som, a direção. Todos contribuíram para aquele resultado. Agora, o que isso pode significar no futuro ou como vai afetar a minha carreira, bom, só o amanhã poderá dizer.

 

Você tem filmes lindos no currículo. Sou particularmente fã de Sangue Azul e A Hora e a Vez de Augusto Matraga (2011). No entanto, há outros menores, como esses que você recém citou, como As Horas Vulgares, O Que se Move e Teobaldo Morto, Romeu Exilado que também se destacam, porém foram pouco vistos. Como você escolhe cada novo projeto?
É uma coisa até meio hippie, preciso confessar, mas é mesmo pelo acaso. Vou me relacionando com as pessoas que gosto, entende? Nada mais me interessa. É curioso, mas além da história, ou do personagem, do projeto como um todo, o que importa para mim é a experiência, quem vai estar ao meu lado durante essa etapa da minha vida. Gosto do Rodrigo de Oliveira, diretor do Teobaldo, tenho um carinho enorme pelo Caetano, diretor do O Que Se Move, ainda que faça um tempo que não nos vemos. Outra que mora no meu coração é a Flora Dias, diretora de O Sol nos meus Olhos (2013), outro filme lindo. Há sempre uma relação anterior de interesse pelas pessoas. É assim que vou me aproximando. Tem que haver uma afeição anterior. O resto é consequência. Se o filme fica pronto e acaba dando certo, mais gente se interessa por ele e começa a circular, é pura sorte.

Rômulo Braga e João Gabriel Vasconcellos em As Horas Vulgares

Além de Elon Não Acredita na Morte, você está também no elenco de Joaquim, que se encontra em cartaz nos cinemas e foi selecionado para o Festival de Berlim. Como foi essa experiência?
Foi maravilhosa. A gente ficou quase dois meses na Chapada Diamantina, um grupo de pessoas que formava uma equipe muito interessada e, também, interessante. Meu personagem, na descrição histórica, era chamado de vagabundo, um cara sem eira nem beira. Ele estava no limite, não era bem escravo, mas trabalhava por um prato de comida. Um sobrevivente, um mestiço, e isso numa sociedade preconceituosa. Então foi incrível, pois tive muita liberdade para desenhá-lo, ir buscar elementos fora do contexto social, e toda a pesquisa de personagem foi uma grande descoberta, pois tive a cidade inteira para me alimentar. O Marcelo (Gomes, diretor) chegava pra mim e dizia: “Se joga, aproveita! Sem muitos cuidados! O caminho do personagem era esse mesmo!”. Então, receber essa confiança, ao mesmo tempo em que estava cheio de companheiros ao meu redor, e poder aproveitar esse processo, foi algo único em toda a minha carreira.

 

O que você pode nos adiantar sobre Os Dias Sem Tereza, seu próximo filme?
É uma pequena participação, algo quase carinhoso. O filme já está pronto, já teve suas primeiras exibições, logo mais estará surgindo por aí. Agora, desafiador mesmo foi o que fiz com a Simone Cortezão, que vai se chamar Navios de Terra. Eu faço um marinheiro que está indo para Suíça, que o meio do caminho que ele tem que fazer. Há uma premissa muito bonita, pois começa com a poética da transposição das montanhas de Minas Gerais para a China, olha que loucura! Então, tenho em mãos um ser humano situado em uma geografia diferente, que está envolvido naquele universo desde a mineração. E as filmagens foram inacreditáveis, fomos para China, Taiwan. Tudo muito excitante!

Cena de Sangue Azul

Bom, já sabemos que Elon não acredita na morte. No que, ou em quem, ele acredita, então?
Ele acredita no amor (risos)!                                                                  

(Entrevista feita por telefone com o ator direto de São Paulo em abril de 2017)

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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