19 jun

À vista de Enrique Diaz

A família Diaz tem um histórico muito importante no Brasil – e não estou falando de Cameron, a musa hollywoodiana, e sim dos irmãos Chico e Enrique. Filhos de um diplomata paraguaio, o mais velho nasceu no México, enquanto que o caçula é natural do Peru. Os dois, ainda crianças, no entanto, vieram morar no Brasil quando o pai foi para cá transferido, e aqui se encontram até hoje. Enrique Diaz talvez não seja tão popular quanto o irmão mais velho, mas tem uma carreira tão expressiva quanto. Desde o início dos anos 1980 vem atuando em cinema, televisão e teatro, diante os olhos do público e também nos bastidores. Diretor premiado, é por causa essa atividade que retorna aos palcos nacionais com a peça À Primeira Vista, estrelada por Drica Moraes e Mariana Lima. Em cartaz desde o início do ano no Rio de Janeiro, faz uma curta temporada no Rio Grande do Sul no final de junho, para depois retornar ao cenário carioca. E foi sobre esse novo projeto, e também sobre suas experiências cinematográficas – como atuar ao lado do oscarizado Ben Kingsley – que conversamos nessa entrevista exclusiva, feita por telefone no início do mês.

 

Como você decidiu dirigir À Primeira Vista?

Foi algo natural. Já havia dirigido outro texto do mesmo autor, o In on It, em 2010. Quando fiquei sabendo que o Daniel MacIvor tinha um novo trabalho isso me interessou de imediato. Acho o cara um gênio, com uma visão de mundo incrível. As histórias que ele cria possuem muito afeto, humor, é uma mistura bacana de todos os elementos que formam as pessoas. Tem relacionamentos, namoros, família… é muito engraçado e, ao mesmo tempo, comovente. Ele possui uma métrica muito particular. Tudo se desenvolver em três esferas paralelas, o individual, o social e o global, e ele levanta todas estas discussões, nos mais variados âmbitos. Em In on It eram dois atores, e em À Primeira Vista são duas atrizes, então é como se fosse o reverso da mesma história, um In on It para mulheres. Tem um jogo semelhante entre as duas peças, mas essa é mais jovial, focando muito no início de uma amizade, sempre propondo uma alternância com coisas muito divertidas.

Com Mariana Lima e Drica Moraes no cenário de À Primeira Vista

No bate papo que tivemos com a Drica Moraes sobre o personagem dela em À Primeira Vista, ela comentou sobre a diferença de idade entre as intérpretes – ela e a Mariana Lima – e as personagens. Isso chegou a ser um problema?

Não, em nenhum momento. Pra começar, a idade das personagens nunca chega a ficar preciso, não é dita com exatidão. E depois tem o fato de que a história é de duas amigas que resolvem olhar para trás em suas vidas, ou seja, é mais fácil colocar uma atriz de 40 anos que decide se ver aos 20 do que o contrário. E tem também o fato de que adoro trabalhar com quem possuo uma intimidade, uma relação. Em In on It os intérpretes eram o Fernando Eiras e o Emílio de Mello, dois dos meus melhores amigos. Agora, em À Primeira Vista, tenho em cena a minha ex-mulher, a Drica, e a minha atual esposa, a Mariana. E nós três nos damos muito bem. Isso pra mim é muito importante. E as duas estão muito adequadas.

 

À Primeira Vista estreou este ano no Rio de Janeiro. Como está sendo a recepção dos cariocas?

Nossa, melhor do que esperávamos. O retorno tem sido ótimo, não poderia ser mais positivo. O público sai feliz, comentando, indica aos amigos. E as críticas e avaliações nos jornais tem sido excelentes. A Martha Medeiros, numa crônica que ela escreveu no O Globo, se não me engano, falou muito bem, num artigo muito elogioso. A comunicabilidade com o público tem sido muito boa. A diferença, agora, nessa ida ao Sul, é que tanto em Porto Alegre quanto em Pelotas são teatros maiores, com plateias mais amplas. Aqui no Rio de Janeiro é um espaço menor, mais íntimo. A proximidade é mais efetiva. Mas vamos fazer algumas alterações, leves mas efetivas, para aproveitar melhor esse alcance que teremos no Rio Grande do Sul.

Com Fernando Eiras e Emílio de Mello nos ensaios de In on It

Vocês estão saindo em turnê nacional?

Não. Faz apenas três meses que estreamos no Rio de Janeiro, e pretendemos ficar mais tempo por aqui. Essa temporada no Rio Grande do Sul é uma exceção, é uma parada única. Gostamos muito do público do Sul, e sempre que possível vamos retornar. Então, quando surgiu essa oportunidade de datas disponíveis em Porto Alegre e em Pelotas, achamos que valeria a pena essa viagem, pois é importante mostrar nosso trabalho em outros estados, ainda mais num que sempre nos recebeu tão bem. Depois daí, faremos uma exibição única em São Paulo, num festival, e retornamos ao Rio de Janeiro, onde devemos ficar por, no mínimo, mais seis meses. A Drica vai começar uma novela, temos outros projetos, então é mais fácil e cômodo para nós todos ficarmos por aqui. Porto Alegre é muito querida para nós, o Theatro São Pedro é um dos espaços mais lindos do país, é muito bacana estarmos tendo essa oportunidade. É quase como se fosse uma nova estreia.

 

Apesar de ser o diretor de À Primeira Vista, o público te reconhece também como ator de diversos filmes e novelas. O que prefere, atuar ou dirigir?

Dirigir, pra mim, não é uma novidade: faz 25 anos que dirijo meus próprios projetos. A diferença é que ninguém me chama para ser diretor, só como ator. Então vou combinando uma coisa ou outra, de acordo com as possibilidades. Adoro atuar, mas quando penso em algum projeto, em algo que quero muito fazer, é sempre dirigindo que me vejo. Tenho essa urgência, essa vontade de realizar, e não vou ficar sentado esperando que alguém me chame. Quando quero muito algo, vou e faço. Minha casa é o teatro, mas adoro o cinema e a televisão. Então, quando surgem convites nessas áreas e estou disponível, aceito com muito prazer. Não fico esperando, angustiado, mas quando acontece é muito bacana.

Com a esposa Mariana Lima

A tua carreira no cinema também é bastante longa. Como foi a estreia na tela grande?

Ah, foi uma experiência que guardo até hoje com muito carinho. Foi em 1985, no filme Urubus e Papagaios, do José Joffily. Era uma comédia muito bacana, tinha ainda o Felipe Camargo no elenco, um grande amigo meu. Lembro que na época tinha um exame marcado para entrar na CAL (Casa de Artes de Laranjeiras, escola de teatro no Rio de Janeiro), e não pude fazer porque no mesmo dia eu deveria estar no set de filmagens. E eles não foram nada compreensivos, não consegui entrar no curso por causa dessa falta. Daí pensei: se uma escola de atuação não fica feliz por um aluno já estar atuando, então talvez ela não me sirva. E assim foi minha formação, sempre na prática.

 

Logo depois você participou de O Quinto Macaco (1990), um longa internacional feito no Brasil. Como foi essa experiência?

Meu papel era muito pequeno, mas só o fato de estar ali, num set internacional, ao lado do Ben Kingsley, que havia recém ganho um Oscar e tal… foi muito impressionante. Mas o que mais me chamou atenção nesse filme foram os macacos. Eles são muito profissionais (risos)! O que se pedia eles faziam, era surpreendente! Minha carreira, hoje, tem mais de 20 anos, mas durante todo esse tempo vi poucos atores tão compenetrados e aplicados quanto aqueles macacos!

Com o elenco de Filhos do Carnaval

Qual dos teus filmes que mais te marcou?

Na verdade, enquanto ator, o que mais me marcou foi um projeto que tem cara de cinema, é feito como se fosse cinema, mas não foi exibido no cinema: é a série Filhos do Carnaval, da HBO. Apesar de ser um programa de televisão, foi tão bem feito, com tantos cuidados, sem pressa, sem exageros… o resultado é muito bom e tenho muito orgulho de ter participado. A equipe é de cinema, os roteiristas, o set de filmagens… tudo era como numa produção de cinema, com a única diferença é que a exibição era na televisão. Acho que esse foi o meu melhor trabalho como ator.

 

Quais são seus próximos projetos no cinema?

Estou envolvido no momento numa história muito bacana, que tem tudo para ser muito legal. É o filme Noites de Reis, que foi filmado em novembro do ano passado, para ser lançado em 2013. No elenco, além de mim, está também o Flávio Bauraqui e a Bianca Byington. A direção é do Vinícius Reis, e a história é baseada em experiências dele, bem memorialista. Algo muito bonito, sensível. Acho que será um belo filme. E tenho ainda dois outros roteiros, já prontos, que estou desenvolvendo. Vamos ver se acontecem.

 

(Entrevista feita por telefone no dia 10 de junho de 2012)

 

Robledo Milani

é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

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