O Teste de Bechdel (também conhecido como Bechdel-Wallace) existe desde a década de 80, quando surgiu numa tirinha da cartunista norte-americana Alison Bechdel, mas está sempre em pauta nas discussões sobre representatividade feminina na mídia. Os requisitos para passar no teste são bastante simples: basta que a obra audiovisual tenha no mínimo duas personagens femininas (preferencialmente com nomes próprios) conversando sobre algo além de homens. Recentemente, o Brasil se tornou o primeiro país da América Latina a adotar o selo A-Rate, classificação específica para os filmes que cumprem os três critérios propostos por Bechdel. A iniciativa surgiu em Estocolmo, na Suécia, quando a diretora de uma sala de cinema passou a marcar com um selo os cartazes de filmes que passavam no teste, atraindo atenção à presença feminina (ou falta dela) no cinema.

Mas o que esse selo diz sobre um filme ou programa de televisão, efetivamente? Para falar a verdade, quase nada. Passar no teste de Bechdel não atesta a qualidade de uma obra e nem mesmo a classifica como arte feminista ou politicamente engajada em qualquer frente. É possível que um longa-metragem com ideias profundamente misóginas seja A-Rated, pois é necessário apenas que ele tenha uma mísera cena de duas mulheres conversando sobre sapatos ou utensílios domésticos, por exemplo. Da mesma maneira, um filme escrito, dirigido e protagonizado por mulheres pode falhar no teste se, por uma razão ou outra, não colocar outra personagem feminina para conversar com a protagonista. Se visto como uma espécie de “feministômetro” aplicado a obras de maneira individual, o teste é fundamentalmente falho.

A ideia, entretanto, não é classificar esta ou aquela produção, mas incentivar o público a pensar sobre a representação feminina num contexto mais amplo. Se a maioria esmagadora dos blockbusters da década não consegue se encaixar nos três simples critérios de Bechdel-Wallace, o problema não reside em cada um dos filmes, e sim na indústria. Essa simples análise funciona, na verdade, como uma maneira de expor a aparente dificuldade que o cinema mainstream tem de inserir personagens femininas em suas narrativas e desenvolvê-las com alguma dimensão e complexidade.

Há uma maneira muito simples de comprovar esse paradigma: basta aplicar o teste de Bechdel reverso (isto é, a narrativa deve ter dois homens que conversam sobre um assunto não relacionado a mulheres). A discrepância entre o número de produtos que falham no teste tradicional e no reverso é, para dizer o mínimo, dramática. De qualquer maneira, não fique triste se seu filme favorito não conseguir cumprir três requisitos tão básicos; muitos não conseguem. Hoje, o teste serve principalmente para mostrar ao público que uma quantidade alarmante de projetos não sabe representar mais da metade da população mundial. Com a ajuda do selo A-Rate, o público deve ficar mais atento a isso para que, no futuro, o cinema seja mais diverso, mais plural e muito mais rico.

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cursa Jornalismo na Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo e é editora do blog Cine Brasil.
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