Leonard Simon Nimoy – ou apenas Lenny, como os amigos e familiares o chamavam – nasceu no dia 26 de março de 1931 em Boston, Estados Unidos. Filho de imigrantes judeus ucranianos, não teve uma infância fácil, e iniciou na carreira de artista com ainda maiores dificuldades. Uma das suas características, no entanto, sempre foi a perseverança, o que o levou a persistir atrás do seu sonho até ganhar a oportunidade de criar um dos personagens mais populares do século XX na cultura pop: o Sr. Spock, da série Star Trek. E foi com esse mesmo otimismo que seguiu por uma carreira que durou mais de sessenta anos, até decidir se aposentar, em 2010. A decisão aconteceu após ser diagnosticado com uma doença pulmonar crônica, que afirmava ter sido resultado do hábito de fumar, que manteve por décadas e do qual havia desistido há mais de vinte anos. No entanto, nem um herói como ele conseguiria resistir para sempre, e na manhã do dia 27 de fevereiro de 2015 veio a falecer em Los Angeles, ao lado de sua família, aos 83 anos de idade.

Ainda que contrário ao desejo dos pais, desde os oito anos de idade Leonard Nimoy deixou clara sua paixão pela arte da interpretação, já aparecendo em pequenas peças teatrais. Na adolescência passou a frequentar uma escola de atores local. Logo decidiu abandonar os estudos e se mudar para Los Angeles, onde conseguiu sua primeira participação no cinema, na comédia Queen for a Day, de 1951. Sua estrela parecia estar brilhando, e na sequência foi chamado para ser um lutador de boxe em Kid Monk Baroni (1952). Este filme, no entanto, foi um retumbante fracasso, e pela próxima década seguinte tudo o que conseguiu foram participações menores, a maioria em projetos de televisão. Chegou a ganhar tão pouco que teve que trabalhar como entregador de jornais para conseguir pagar suas contas.

Como o boxeador Kid Monk Baroni, em 1953

Em 1953, foi convocado pelo Exército. Durante o tempo como militar, casou-se com sua primeira esposa, Sandi. Foi ela que o convenceu a continuar atuando quando pensava em desistir de tudo e buscar um emprego mais estável. Desta época, chama atenção o pequeno papel que vez em Zombies of the Stratosphere (1952), em que aparecia apenas no final como um marciano. Foi o primeiro extraterrestre de uma carreira que ficaria marcada por dar a vida a um alienígena. Nos anos seguintes participou de séries como Dragnet (1954), M Squad (1959), Bonanza (1960), Além da Imaginação (1961), Os Intocáveis (1962), Perry Mason (1963), Dr. Kildare (1963) e The Man from U.N.C.L.E. (1964). Foi durante as filmagens desta última em que trabalhou pela primeira vez com o ator William Shatner, que viria a interpretar o Capitão Kirk em Jornada nas Estrelas, série iniciada em 1966 e que em sua formação original permaneceu no ar, entre idas e vindas, por vinte anos!

A voz grave, a altura – com 1,82m, era o mais alto da tripulação da Enterprise – e a postura diferenciada aos poucos o tornaram um ‘character actor’, ou seja, um ator de personagens distintos. Foi por isso que o roteirista e produtor Gene Roddenberry o convidou para interpretar Sr. Spock, filho de uma mãe humana com um pai alienígena, oriundo do planeta Vulcano. Coube a ele a primeira fala do episódio-piloto da série: “chequem os circuitos!”. A emissora NBC, no entanto, considerou o programa muito intelectualizado e lento, e ordenou a produção de um novo piloto. Todo o elenco foi substituído – com exceção de Nimoy, o único que permaneceu. Entre os novatos estava Shatner, que se tornaria um dos seus melhores amigos.

Ao lado de William Shatner, nos bastidores de Jornada nas Estrelas

Leonard relembra a emoção quando o programa foi aprovado: “pela primeira vez na vida eu tinha um trabalho que iria durar por mais de duas semanas e um camarim com o meu nome pintado na porta, ao invés de escrito a giz”. Foi ele, ainda, que criou a famosa saudação do seu personagem, com a mão aberta e os dedos separados em “V”, que foi exibida pela primeira vez em 1967. A expressão “vida longa e próspera” completava o cumprimento. O personagem, no papel, era bem diferente daquele imortalizado pelo ator. Era um tipo mais despreocupado e sem grandes funções. Foram iniciativas dele torná-lo sem emoções, cerebral e permanentemente sério. O resultado foi tão impressionante que nunca mais foi esquecido.

A primeira incursão de Jornada nas Estrelas na televisão durou apenas três anos, e em 1969 Nimoy foi escalado para a série Missão: Impossível. Durante todo esse tempo, nunca abandonou o teatro, tendo atuado em montagens de textos clássicos como Um Violinista no Telhado, Oliver, Camelot e Equus, entre outras. Seguiu, também, com pequenas participações no cinema, em filmes como O Balcão (1963), indicado ao Oscar de Melhor Fotografia, Catlow (1971), faroeste com Yul Brynner, e o clássico Os Invasores de Corpos (1978), de Philip Kaufman. No ano seguinte, impulsionados pelo retorno da série à televisão e pela crescente empolgação dos fãs, estreou na tela grande com seu personagem mais famoso em Jornada nas Estrelas: O Filme (1979). Com o impressionante sucesso de bilheteria, outras sequências foram encomendadas. Nimoy participou dos seis primeiros filmes, tendo dirigido dois deles: Jornada nas Estrelas III: À Procura de Spock (1984), que foi muito criticado, e Jornada nas Estrelas IV: A Volta para Casa (1986), um dos mais bem sucedidos de toda a série.

Como o Sr. Spock, em Jornada nas Estrelas

Ao mesmo tempo em que trabalhava como dublador e ator, seguia dirigindo sucessos como a comédia Três Solteirões e um Bebê (1987), com Tom Selleck, o drama O Preço da Paixão (1988), com Diane Keaton e Liam Neeson, e o frustrante As Coisas Engraçadas do Amor (1990), com Gene Wilder. Foi ainda apresentador de programas de televisão e autor de diversos livros de poesia. Todas essas atividades tinham como principal objetivo distanciá-lo do personagem que representou sua maior sorte e, por muitos anos, também uma maldição. Em 1975 publicou sua primeira autobiografia, intitulada Eu Não Sou Spock, na qual, outras coisas, revelava o vício no álcool e a dificuldade em lidar com a fama. Com o tempo, no entanto, conseguiu equilibrar melhor as coisas. Tanto que o segundo volume de sua autobiografia, publicada muitos anos depois, se chamou Eu Sou Spock. Foi essa tranquilidade que o levou, também, a aceitar voltar ao personagem na reimaginação da saga em Star Trek (2009), de J. J. Abrams, em que grande parte da trama contava com sua participação fundamental, levando-o a contracenar com Zachary Quinto, ator que interpretava a versão jovem do Sr. Spock. As pazes estavam feitas, portanto, na vida real e também na ficção.

Leonard Nimoy decidiu se aposentar logo em seguida, em 2010 – mas não por muito tempo. Voltou em algumas ocasiões, a última delas para uma participação especial na sequência Além da Escuridão: Star Trek (2013). Em fevereiro de 2014, anunciou publicamente ter uma grave doença no pulmão. Desde então procurou se refugiar na intimidade familiar – teve durante a vida dois filhos e cinco netos. Nos últimos meses recorreu à ajuda médica em mais de uma ocasião, e encontrava-se internado no hospital há mais de uma semana quando faleceu. A mensagem que deixou para os fãs, amigos e familiares pode ser aquela escrita por ele próprio em seu último acesso a sua conta no Twitter: “A vida é como um jardim. Podemos ter momentos perfeitos, mas não preservá-los, a não ser na memória”. Vida longa e próspera, Sr. Nimoy, nas lembranças de centenas de milhares de admiradores de todo o mundo, nesta e em outras galáxias!

Como Spock na releitura Star Trek, de 2009

Filme imprescindível: Jornada nas Estrelas: O Filme (1979), a primeira incursão do seu maior personagem na tela grande

Filme Esquecível: Ninguém que participou dos longas da série Transformers – com exceção do próprio Michael Bay (que, por sinal, era primo da esposa de Nimoy) – precisa ser lembrado disso. E astro emprestou sua voz grave para Transformers: O Lado Oculto da Lua (2011), em que apareceu como o Sentinel Prime!

Maior sucesso de bilheteria: Como ele mal aparece em Além da Escuridão: Star Trek (que arrecadou quase US$ 500 milhões em todo o mundo), vamos considerar Star Trek (2009), que teve um faturamento de US$ 385 milhões em todo o mundo – é o filme de maior sucesso da série nos EUA – e no qual seu personagem tem participação fundamental (e vamos esquecer sua participação em Transformers: O Lado Oculto da Lua, ainda que este tenha arredado mais de US$ 1,1 bilhão em todo o mundo)

Primeiro filme: Queen for a Day (1951), quando ainda assinava como Leonard Nemoy

Último filme: Além da Escuridão: Star Trek (2013), o adeus final do eterno Capitão Spock

Guilty pleasure: Como dublador há vários, inclusive episódios de Os Simpsons, mas muita gente se divertiu mesmo foi com a comédia Três Solteirões e um Bebê, dirigida por ele em 1987 e que somou quase US$ 200 milhões nas bilheterias dos EUA

Premiações: O mais perto que chegou do Oscar foi com Jornada nas Estrelas: A Volta para Casa (1986), dirigido por ele, que foi indicado em quatro categorias: Fotografia, Som, Efeitos Sonoros e Trilha Sonora Original. O ator, no entanto, foi indicado três vezes ao Emmy pelo personagem Spock na série Jornada nas Estrelas (em 1967, 1968 e 1969), além de ter sido premiados pelos críticos de Boston e de Denver como parte do elenco de Star Trek (2009)

Frase inesquecível:Spock é, definitivamente, um dos meus melhores amigos. Quando coloco aquelas orelhas, não é mais um dia comum. Quando me torno Spock, meu dia fica realmente especial”.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
avatar

Últimos artigos deRobledo Milani (Ver Tudo)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *