Ang Lee é um realizador que nunca passa desapercebido. Seus filmes podem ser polêmicos, revolucionários, incômodos, inovadores e tensos, mas nunca menos do que brilhantes. E na linha dos oscarizados Razão e Sensibilidade (1995), O Tigre e o Dragão (2000) e O Segredo de Brokeback Mountain (2005), se adiciona também seu último projeto, o aclamado As Aventuras de Pi (2012), produção que recebeu 11 indicações ao Oscar deste ano e saiu da festa como o mais premiado, levando consigo quatro estatuetas – entre elas, a de Direção, a segunda recebida por Lee. Elogiado pela crítica e aplaudido pelo público – mais de US$ 600 milhões arrecadados nas bilheterias de todo o mundo – ainda assim este filme está longe de ser uma unanimidade. Acusado de plágio por alguns e de superestimado por outros, é uma obra que justifica qualquer boa discussão a respeito. Como essa nova edição do Confronto, em que Matheus Bonez e Pedro Henrique Gomes exploram suas opiniões, em até 200 palavras, sobre os prós e os contras do visualmente encantador As Aventuras de Pi. Confira!

 

A FAVOR:Poesia retratada através de imagens”, por Matheus Bonez

Ang Lee é um diretor que acredita na sensibilidade do ser humano, mesmo que muitas vezes às avessas. Em seu currículo, não faltam referências a isto, seja de forma mais trágica como em O Segredo de Brokeback Mountain (2006), através da ciência na sua versão de Hulk (2003) ou em um contexto familiar, como em Tempestade de Gelo (1997). Porém, As Aventuras de Pi funciona como um renascimento do homem através da mente, afogando a tristeza pessoal e ressurgindo das cinzas na fantasia, como uma legítima fênix. É no conto do jovem Piscine e sua luta pela sobrevivência em alto mar que os sentimentos e, especialmente, os instintos ficam à flor da pele. Ora, o que é o tigre Richard Parker se não um duplo do protagonista, um espectro de sua selvageria contida, uma força nunca descoberta? Lee tinha tudo para fazer o filme cair no sentimentalismo barato, porém o que consegue é mostrar uma história de fé natural e como cada um lida com sua dor, exemplificada da melhor maneira possível. Muitos falaram que a história seria difícil de ser contada. E é. Mas para quem gosta de bom cinema, é como poesia retratada através de imagens.

 

CONTRA:Reprodutor de ideias clichês e antiteológicas”, por Pedro Henrique Gomes

As Aventuras de Pi é, de um lado, produto de uma indústria (o sistema hollywoodiano) bastante eficiente; por outro, vítima das consequências desse enquadramento estético e conceitual puramente visual e narrativo (no sentido de diluição dos personagens em caricaturas, neste caso, do pensamento religioso, e na glorificação dos aparelhos), realizado para não incomodar ninguém. Numa outra via, tem um diretor nada inocente em suas ideias. Ora, a tese do filme de Ang Lee é clara: a espiritualidade de Pi não é necessariamente uma virtude, pois pode ser simplesmente uma ilusão que lhe serve bem desde que se escolha a narrativa certa (mesmo que seja falsa). Isto é, disfarçado de uma história sobre fé e superação, o filme quer mesmo é questionar a ordem dos discursos. Seu grande problema é que, para tanto, ele acaba tornando seu protagonista um robô reprodutor das ideias mais clichês e antiteológicas possíveis para que fique mais fácil colocá-las em disputa. As conversas entre Pi e o escritor reproduzem a ingenuidade dos personagens (um cético e um crente brincando de provar a existência de Deus) e inviabilizam uma discussão mais ampla e corajosa.

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