Infelizmente, o 5+1 desta semana não comemora apenas o aniversário, mas também a ausência de um grande astro. Com a trágica morte de Philip Seymour Hoffman, encontrado sem vida em seu apartamento no dia 2 de fevereiro de 2014, a equipe do Papo de Cinema resolveu celebrar a carreira deste brilhante ator que entregou performances memoráveis em mais de vinte anos em frente às telas.

Pode-se dizer que Hollywood perdeu um de seus melhores. Vencedor do Oscar, de outros 72 prêmios e indicado a mais 54, o ator, que apesar de não ser um galã, foi, até então, um dos representantes máximos de exemplo na escolha de papéis. Seja fazendo uma drag queen no pequeno e tocante Ninguém é Perfeito (1999), um divertido coadjuvante de luxo em uma comédia boba (Quero Ficar com Polly, 2004), um vilão de causar arrepios (Missão Impossível 3, 2006) ou um irmão amoral (Antes que o Diabo Saiba que Você Está Morto, 2007), Philip gostava de ousar. E este mix de papéis tão diversos vai fazer falta. No dia que seria seu aniversário, neste 23 de julho, com saudade, mostramos nosso carinho e respeito pela pessoa e por seus trabalhos, que são de tirar o fôlego de qualquer amante do bom cinema, apontando os cinco mais marcantes, além de lembrar de mais um especial. Descanse em paz, Philip!

 

Magnólia (1999)
Por Marcelo Müller

Magnólia, de Paul Thomas Anderson, é um filme sobre gente à deriva. A narrativa em múltiplos núcleos evidencia um mal-estar generalizado, pois nela a solidão é o único bem compartilhado, seja por gurus de autoajuda, policiais, gênios, idiotas, entre outros. No longa, as próprias conexões reforçam esse abismo ao qual estamos mais ou menos condenados, cabendo-nos um passo à frente ou o recuo em busca de alternativas. Nesse panorama, onde a dor é cantada lá pelas tantas, dentro da qual uma improvável chuva de sapos pode purificar os pecados do mundo, tal o cordeiro de Deus, o enfermeiro Phil Parma (Philip Seymour Hoffman) vê de perto a morte se aproximar de seu paciente ao passo que lida com as próprias angústias. Dentro de um elenco tão recheado de gente talentosa, o recém-falecido Hoffman, um dos mais expressivos atores de sua geração, comove pela simplicidade com a qual constrói seu personagem, fazendo ele grande a despeito do relativo pouco tempo de tela. Poucos atores choraram em cena com tanta emoção.

 

Capote (2005)
Por Robledo Milani

Apesar do que possa indicar, esta não é necessariamente uma cinebiografia do autor de Bonequinha de Luxo (1961), e, sim, um retrato muito particular de um momento específico da vida do escritor. No final dos anos 1950, Truman Capote, ao ler no jornal uma nota sobre dois assassinos que eliminaram uma família inteira durante um assalto, decide ir até a cidade onde o fato aconteceu e, através de entrevistas, descobrir as motivações dos assassinos. O resultado foi o livro A Sangue Frio, considerado o marco de um estilo literário até então inédito, o ‘novo jornalismo’. Muitos são os méritos deste longa indicado em cinco categorias do Oscar 2006, entre elas Melhor Filme e Direção, mas o principal é o desempenho arrebatador de Philip Seymor Hoffman como o protagonista. Ele simplesmente desaparece por trás desta nova personalidade, reproduzindo com impressionante precisão os maneirismos, a loucura e a genialidade de um artista em pleno processo criativo. Em nenhum momento se percebe o ator; quem está presente é sempre o personagem, dono absoluto da trama em evolução. Cada pequeno gesto – uma troca de olhar, uma inflexão na voz, um gesto manual – denota esta impressão. Há muito o que se comentar sobre a obra como um todo, mas poucos poderão esquecer este desempenho realmente singular.

 

Jogos do Poder (Charlie Wilson’s War, 2007)
Por Rodrigo de Oliveira

Vencedor de dois Oscars, Tom Hanks é um dos atores mais importantes de sua geração e uma figura que rouba a atenção de todos quando está em cena. No entanto, em Jogos do Poder, o eterno Forrest Gump tem um companheiro à altura, que consegue se sobressair em diversos momentos: o também vencedor do Oscar Philip Seymour Hoffman. Ao viver o agente da CIA Gust Avrakotos de forma bastante irônica, o ator ganha as melhores falas do roteirista Aaron Sorkin. As cenas memoráveis de Jogos do Poder, inclusive, são os diálogos cheio de esperteza que Gust troca com Charlie Wilson, o deslumbrado senador texano vivido por Hanks. O fato é que Wilson é muito interessante em sua concepção original: um homem viciado em cocaína, uísque e belas mulheres que é praticamente o responsável pela derrocada da União Soviética. Mas o filme acaba pasteurizando a imagem do senador, não lhe dando uma dimensão real. Com isso, e com o talento de Hoffman que tão bem conhecemos e que sentiremos falta, o ator rouba as cenas em que aparece, sendo o único indicado desta produção ao Oscar 2008. O filme pode não ser um dos grandes, mas Hoffman o tornou imperdível.

 

Dúvida (Doubt, 2008)
Por Renato Cabral

Nessa produção de orçamento enxuto dirigida por John Patrick Shanley (Joe Contra o Vulcão, 1990) encontramos a história de Padre Flynn, que é confrontado pela Irmã e diretora da escola católica em que trabalha, devido a relação ambígua que mantém com um estudante problemático. O padre em questão é interpretado por Hoffman, em mais uma de suas grandes performances da carreira. O tom de suspense que prevalece durante toda a produção é excepcional e o ator, colocado para contracenar com Meryl Streep, demonstra em cena uma química perfeita com a atriz. Um verdadeiro show de atuação. Em uma das melhores cenas de Dúvida, o Padre confronta a Irmã e questiona o porque da suspeita que se abateu contra ele. O que não há como questionar é a qualidade do trabalho de Seymour Hoffman, que inclusive foi indicado ao prêmio da Academia, o Oscar, pela sua performance no filme.

 

O Mestre (The Master, 2012)
Por Thomás Boeira

Um dos grandes filmes do diretor Paul Thomas Anderson, O Mestre nos apresenta ao veterano da Segunda Guerra Mundial Freddie Quells (Joaquin Phoenix), que passa a seguir um culto filosófico chamado de “A Causa”, criado por Lancaster Dodd (Hoffman). Na época de seu lançamento, o filme causou certa polêmica por poder se tratar da história da Cientologia, religião de astros como Tom Cruise e John Travolta, e há certos elementos que fazem “A Causa” ser um pouco semelhante a ela. Mas Anderson aproveita para discutir religião de modo geral, fazendo um estudo interessante do impacto que isso tem na vida das pessoas. No entanto, boa parte do brilhantismo de O Mestre se deve ao fantástico elenco unido por Anderson, que traz Phoenix, Hoffman e Amy Adams em algumas de suas melhores atuações. Hoffman, em particular, faz de Lancaster Dodd um líder carismático e persuasivo, não sendo difícil entender o porquê de as pessoas o seguirem. Mas, ao mesmo tempo, consegue ser um homem pouco confiável para o espectador, como podemos ver na forma como reage quando alguém questiona suas ideias. Uma atuação magnífica, que rendeu a Hoffman sua quarta indicação ao Oscar.

 

+1

Sinédoque, Nova York (Synecdoche, New York, 2008)
Por Yuri Corrêa

Até hoje o único filme dirigido pelo excepcional roteirista Charlie Kaufman, Sinédoque, Nova York, pode até não ser o mais lembrado longa-metragem estrelado por Hoffman, mas é, de longe, o filme e o papel mais complexos, profundos e tocantes de sua carreira. Apresentando o roteirista teatral Caden Cotard, descobrimos que este ganhou um prêmio que irá financiar a sua próxima peça seja qual for o orçamento desta, uma mera desculpa para que embarquemos na inusitada ideia de reconstruir toda Nova York dentro de um galpão enorme, onde a peça em si será o cotidiano da cidade, e onde, obviamente, terá de existir Cotard fazendo seu estranho espetáculo; e logo nos vemos em uma espécie de inception onde já há mais de três atores interpretando outros atores interpretando Cotard, e assim por diante. Um estudo de personagem irrepreensível, um mergulho no tema do ponto de vista dentro da linguagem cinematográfica, Sinédoque, Nova York é um filme obrigatório, que, além de levantar importantíssimos questionamentos sobre o indivíduo enterrado na vida suburbana, condenado a coexistir com várias versões de si mesmo, oferece ainda uma performance de Hoffman que, delicada e calcada nas sutilezas, leva à comoção com facilidade.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
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